quinta-feira, 28 de abril de 2011

O FIM DE UMA VINGANÇA

As ruas da pequena cidade pareciam mortas, nada de estranho poderia acontecer num lugarejo como aquele. A tranqüilidade consumia cada canto da cidade, havia ali um ar de passado impregnando cada milímetro, como se o tempo ali estivesse morto.
A forasteira havia aparecido do nada, um belo dia um táxi parou em frente à velha casa e a garota surgiu. Ninguém sabia ao certo quem era ou o que pretendia ali, viam-na caminhar algumas vezes pelo cemitério, ou quando raramente ia ao mercadinho, seu mistério havia tomado a pequena cidade de Santa Efigênia desde o primeiro dia em que apareceu. Vestia-se de negro, tinha um olhar perdido, do tipo que não encarava ninguém quando falava, além do cemitério e do mercadinho somente a viam caminhar durante a noite.
Alguns dias depois de sua chegada um carro veio e entregou várias caixas, depois nada mais se viu. Não parecia ter família, vivia só.
Era uma garota sem muitos encantos, a única coisa que a fazia diferente de tantas outras era seu comportamento, haviam instalado um telefone na casa pouco antes dela chegar, o que parecia um sinal de que ela deveria ter contatos com alguém. Logo começaram as especulações, suspeitas de todos os níveis sobre a vida da estranha mulher da casa ao lado do cemitério: bruxa, fugitiva, louca ou algo além. Porém ninguém tinha coragem de perguntar quem era a mulher de negro.
Seu nome era Allanna, era somente o que sabiam...
Seu interesse era o velho cemitério, havia uma estranha atração por um túmulo em especial, um velho túmulo que trazia em sua lápide um nome gasto pelos anos: Anne Marie.


Justamente este túmulo tornou-se a curiosidade do povo, tanto pesquisaram entre os antigos da cidade que descobriram que Anne Marie havia morrido a muitos anos, contavam que havia caído de uma ponte pencil e fraturado quase todos os ossos do corpo numa pedreira.
Contavam muitas coisas... mas somente não contavam o que realmente havia acontecido.
Certa tarde Allanna havia resolvido ir até o mercadinho, lá encontrou como todos os dias em que o freqüentava, Marta, a dona, desta vez porém resolveu perguntar sobre a história de Anne Marie.
_ Anne era uma jovem, devia ter a sua idade, é... pelo que minha mãe contava... dizem que se apaixonou perdidamente por um rapaz estranho, um moreno, sua família jamais aceitaria o namoro, eram descendentes de alemães, porém Anne o amava e passou a encontrar-se as escondidas com ele, mas ela tinha uma irmã.
_ Uma irmã?
_ Sim, e ao que me parece esta irmã descobriu tudo e também se encantou pelo moreno, porém ele só tinha olhos para sua Anne.
_ E então o que houve?
_ Uma tarde ela seguiu Anne, quando esta voltava de um encontro com seu amado ela a empurrou da ponte.
_ Anne foi morta pela irmã?
_ Sim, quer dizer, é o que minha mãe contava, o povo acusou o pobre moreno, seu nome era Pedro.
_ E o que aconteceu com Pedro?
_ Foi morto meses depois numa briga de bar.
_ Mas todos sabiam que ele era inocente... ou não?
_ Não, sempre o acusaram pela morte da garota, meus pais o julgavam inoscente porque eram de gente morena também.


_ Obrigada por me contar esta história... a senhora não sabe de nenhuma foto deles?
_ Talvez na velha casa que foi dos pais de Anne exista uma foto dela, mas infelizmente um forasteiro a comprou com tudo o que havia dentro.
_ Um forasteiro?
_ Sim, um tal de Paulo, dizem que ele quer demulir os velhos túmulos lá do cemitério, desculpe, é que eu sempre te vejo lá no cemitério.
_ Não tem problema, eu estou interessada naqueles túmulos, são parte da história, se depender de mim este forasteiro não toca nos túmulos.
Pela primeira vez Allanna havia falado com alguém sobre os túmulos, de certo modo havia quebrado um pouco do mistério que a cercava.
No dia seguinte alguém a procurou no cemitério, encontrou-a com um bloco anotando nomes e datas:
_ Estava te procurando.
_ E quem é você? Allanna nunca havia visto o tal homem.
_ Sou Paulo Salles, soube que querias ver uma foto da tal Anne Marie.
_ Queria sim, podes me mostrar?
_ Não só de Anne como de Pedro.
_ Seria ótimo...
_ Venha até a minha casa hoje pela tarde e eu te mostrarei as fotos, creio que temos muito o que conversar.
Allanna resolveu aceitar o convite, foi até a tal casa, porém ao ver a ponte que deveria atravessar para chegar até seu destino sentiu um calafrio percorrer seu corpo, respirou fundo e foi em frente, ao chegar na tal casa chamou por Paulo, este veio atendê-la e convidou-a para que entrasse:


_ Aqui neste velho álbum eu tenho as fotos que te falei, as fotos do tal Pedro.
Tomando o velho álbum nas mãos Allanna não acreditou no que via, era exatamente o mesmo homem que estava ali em sua frente: Paulo e Pedro eram iguais.
_ São extremamente parecidos!
_ Sim, somos tão parecidos quanto um sobrinho pode ser com seu tio.
_ Era teu tio?
_ Sim, era meu tio, único irmão de meu avô paterno.
_ Que maravilha!
_ Por que maravilha?
_ Por nada... esqueça.
_ O que te interessa esta história?
_ Soube que queres demolir os túmulos, entre eles o de Pedro e de Anne. Por que isso?
_ Para apagar de vez esta desgraça de minha família, escute uma coisa, não tente interferir nisto, não tente me impedir. Soube que andas pesquisando aquele cemitério, mas lá nada te interessa.
_ O que há de tão mal naquele lugar?
_ Meu tio foi morto por culpa deste povo, por culpa daquela mulher, existe um jura em nossa família, a primeira mulher daquela raça que cruzar o caminho de um de nós deverá pagar por tudo.
_ E o que os túmulos tem com isso?
_ Tudo, devem sumir para apagar esta história, Pedro não era um assassino, não devem lembrar de nossa família como tal.
_ Não lembram...
_ Como tu podes afirmar?


_ A dona do mercadinho me contou a história, ela me disse que ele não foi o culpado.
_ Só ela acredita nisso.
_ E da Anne, não tens uma foto?
_ Ali, sobre aquela parede... Paulo indicou uma parede e voltou os olhos para uma velha moldura, ao mesmo tempo em que Allanna.
_ Então esta era Anne?
_ Que brincadeira é esta? Paulo descontrolou-se num repente.
_ O que houve Paulo?
_ Tu és igual a esta mulher. És uma delas... malditas! Então ainda existem?
_ Ah Paulo, não seja tolo, não sou parecida com ela... sou igual, sou prima dela.
_ O que?
_ Sou prima dela.
_ E o que tu faz aqui?
_ Vim cuidar dos túmulos abandonados de minha antiga família, soube desta história e resolvi investigar.
_ Tu não vai me impedir de demulir aquele túmulo...
_Vou sim, e não tente me impedir.
Ao terminar de falar aquilo Allanna saiu desesperada, tinha que conseguir impedir a demulição dos túmulos.
Daquela tarde em diante a vida de Allanna tornou-se um inferno, todos os dias recebia recados de Paulo dizendo que demuliria os túmulos na semana seguinte. Calada resolveu agir na surdina. No exato dia da demulição Paulo chegou no cemitério logo pela manhã, tudo estava pronto, porém Allanna chegou logo em seguida com um senhor que trabalhava na Prefeitura e alegou ser parente dos mortos e não permitir a demulição.


Confusão formada, os túmulos continuaram de pé.
Dias depois a garota recebeu um bilhete de Paulo, este pedia desculpas e a chamava para conversarem. Inoscente ela aceitou.
Ao chegar na casa dele encontrou-o sentado na escada com um sorriso sarcástico nos lábios, ela porém preferiu ignorar o gesto e perguntar:
_ O que aconteceu?
_ Nada... apenas resolvi terminar o que comecei.
_ O que?
_ Nada, entre por favor.
Allanna entrou desconfiada, ele trancou a porta e voltou-se com um sorriso maligno:
_ Vamos terminar logo...
_ O que quer dizer com isso?
_ Tudo e nada... meu tio morreu por amar uma de vocês, agora vamos acabar com essa história de uma vez por todas.
_ Como?
Ele a puxou e beijou-a, depois com um ar estranho pegou um esqueiro e disse:
_ Te roubei um beijo para que soubesse que mesmo diante do ódio que tenho de ter por ti ainda assim eu te desejo, agora vou atear fogo a esta casa.
_ Queres me matar? É isso?
_ Nos matar...
_ Não faça isso, por favor...
_ Implore!


_ Não Paulo! Não te imploro! Queres me matar, mate, mate e fique aqui, queime junto comigo então, queime para que todos pensem novamente na tua família como na de um assassino.
_ O que tu quer? Não tens medo ou amor á vida?
_ Tanto quanto tu tens...
_ Vá embora daqui, agora, não torne a cruzar meu caminho ou te mato...
_ Mate... já não seria vingança e só loucura.
Allanna não podia esquecer os olhos daquele homem, temia que ele enlouquecesse de vez, mas não podia deixar-se vencer.
Dias depois estava no cemitério, havia levado flores aos túmulos, pois no dia seguinte iria embora, tão distraída estava que nem ao menos viu quando alguém se aproximou:
_ Vim te pedir desculpas, estou indo amanhã mesmo embora...
_ Eu também...
_ Creio que passamos dos limites com nossos loucos devaneios.
_ É verdade...
Durante os minutos em que eles estavam conversando alguém entrou no cemitério, um homem armado, ao vê-los gritou com ódio:
_ Finalmente te encontrei! Vagabundo!
_ Álvaro? Paulo reconheceu o estranho, Allanna estava sem movimentos, correr poderia resultar num disparo.
_ Te procurei por este tempo todo, te procurei para vingar a morte de meu irmão... O estranho estava descontrolado.
_ Eu não matei teu irmão por querer, apenas me defendi...
_ Conversa! Ele era só o que eu tinha, vou te matar... mas antes deixe que eu mate esta menina, talvez ela signifique algo para ti.


_ Não, por favor! Me mate mas não a machuque...ela não tem nada com isso.
Paulo queria proteger Allanna, porém o estranho apontou e disparou... uma fração de segundos e Paulo se atirou sobre a garota, seu braço foi atingido.
Caídos no chão tornaram-se presas fáceis para o louco, num segundo o revólver tornou a disparar... ferido novamente Paulo estava quase agonizando, olhou uma vez mais para Allanna que abraçada a ele chorava:
_ Desculpe... acho que estava começando a te amar...
Louca pela dor e por uma confusão de sentimentos ela o deixou beijá-la, outro tiro e tudo calou-se.
Encontraram os dois mortos, ele deitado sobre o túmulo de Pedro e ela sobre o túmulo de Anne.
Quase seis anos depois a cidadezinha ainda não havia esquecido a morte dos dois jovens, haviam enterrado-os em um malsoléu, lado a lado.
Tudo corria normalmente naquele lugarejo, as mortes eram recordadas como se fossem obra do destino, uma repetição do passado.
Exatamente nesta época apareceu na cidade uma garota, deveria ter a mesma idade que Allanna tinha na época em que morreu.
Como Allanna ela também fazia seus estranhos passeios ao cemitério, porém eram muito mais freqüentes durante a noite do que o dia, era vista muitas vezes com um destes kits de pintura na praça, outras vezes recebia correspondências de grande volume, o que a afastava definitivamente de Allanna, e mais ainda do isolamento.
Zandra, este era seu nome, havia chego na cidade numa manhã ensolarada, desceu do táxi e tirando os óculos escuros fitou toda sua volta, um sorriso cortou seu rosto, voltou-se novamente para o táxi e pagou o motorista que acabava de retirar sua bagagem, algumas caixas e bolsas. A casa era a mesma em que Allanna morava.


Um belo dia a garota estava no mercadinho, Marta fitou-a por alguns instantes:
_ Tens parentes por aqui?
_ Não, por que?
_ Engraçado, tu me lembras muito alguém.
_ Seria muito perguntar quem?
_ Não, a moça que foi morta a alguns anos aqui, a que está lá no malsoléu, ela era muito parecida contigo.
_ E o que aconteceu com ela?
_ Um homem a matou junto com um rapaz da cidade, uma longa história.
_ Poderia me contar?
_ Claro... Marta narrou toda a história, desde Anne Marie.
_ É uma bela história...
_ Triste eu diria.
Zandra voltou para casa com uma certeza e muitas dúvidas. Naquela noite foi a cemitério, o malsoléu estava trancado com um cadeado, ela porém abriu-o com um grampo de cabelo e entrou, no interior encontrou dois túmulos, acendeu as velas que haviam ali e procurou olhar a foto da mulher enterrada ali. Seu susto não foi maior porque Marta já a havia falado sobre a semelhança, olhou o outro túmulo e viu um homem bastante belo. Agora restava descobrir quem era Paulo.
Na manhã seguinte resolveu voltar ao malsoléu, lá encontrou um estranho, assustada recuou...ele porém a chamou:
_ Escute, por favor, não vá. Sabe quem esteve neste malsoléu?
_ Sei... eu estive.
_ Tu és a garota que mora aqui ao lado?
_ Sim, eu sou... desculpe, mas são seus parentes?


_ Ele era meu irmão...
_ Irmão? Ao ouvir a explicação do estranho Zandra percebeu a semelhança dele com  Paulo.
_ Estranho, agora que te olhei é que pude perceber como tu és...igual a esta mulher que está aqui com ele!
_ Desculpe a intromissão, mas tu falou de uma forma tão...tão despresíva sobre ela.
_ Ah sim, ela é a culpada pela morte do meu irmão, por culpa dela ele acabou desta forma.
_ Que horror! Mas espere, eu ouvi falar que a culpa não foi de nenhum dos dois.
_ Tu és parente dela?
_ Não! Eu nem sei, quer dizer, nem sabia que ela existia.
_ Espero que seja verdade...mas me diga, o que faz aqui?
_ Estou apenas vadiando...
_ Interessante! Por que justo aqui em Santa Efigênia?
_ É que eu tenho algo para fazer nesta minha vadiagem.
_ Como assim?
_ Sou uma escritora de primeira viagem, estou buscando subsídios para escrever um romance.
_ Muito bem, e sobre o que pretende escrever?
_ Me interessou muito esta história de amor e ódio secular de sua família e da família dela.
_ Posso te ajudar, venha comigo que te mostro umas coisas que encontrei na casa de meu irmão.


_ Poderia?
_ Claro que sim.
_ Não vou dispensar este favor.
_ Vamos então...
Zandra acompanhou o rapaz até a mesma casa que antes fora de Paulo, somente quando entraram é que ela lembrou-se de algo:
_ Esqueci de perguntar qual seu nome...
_ Meu nome é Igor, e o seu?
_ Zandra, Zandra d’Ávila.
_ Realmente, teu nome não tem nada com o dela, o nome delas é Daniken.
_ Finalmente te convenceu disto?
_ Deve mesmo ser uma triste coincidência do destino este teu rosto, mas deixa para lá.
_ Assim tu me ofende. Sou tão feia assim?
_ Não foi isso que eu disse, se minha família achasse alguma delas feia não teria perdido dois homens por amá-las.
_ Vamos mudar um pouco o rumo desta conversa, deixe-me ver o que tu tens aí sobre essas histórias.
_ Espere um pouco. Quando Igor a deixou só na sala Zandra pode respirar, o lugar a fazia sentir algo inexplicável, algo que nunca havia sentido.
_ Aqui está, são as fotos dos antigos e algumas fotos de meu irmão e dela, depois da morte dos dois as coisas dela vieram para cá, parece que ninguém reclamou nada.
_ Nossa! Que estranho!
_ É realmente estranho, mas não me importa, se algum dia eu encontrar uma delas eu continuarei a vingança.


_ Que vingança?
_ Desde que meu tio foi morto de forma humilhante que uma jura existe entre os homens de minha família, o que encontrar uma delas deverá vingar-se... eu sou o último de minha raça.
_ Desculpe, mas não sei se vale a pena lutar por uma vingança, eles estão mortos e tu...tu está vivo.
_ Vale sim, quando se tem o sangue envolvido nisto vale a pena.
_ Vou embora, obrigada por tudo.
Ao chegar em casa Zandra encontrou algo que não esperava, um recado na caixa postal, ao ouvi-lo entrou num monólogo:
_ Era o que me faltava, justo agora está maluca da Tayse vir para cá, preciso convencê-la de que tem de ficar calada.
No dia seguinte Tayse chegou na cidade, veio com o primeiro ônibus e um carro a levou até a casa de Zandra, ao entrarem Zandra foi logo partindo para cima da amiga:
_ Quando te convidei para vir tu não quis, agora não me venha arruinar com tudo!
_ Calma, eu estou disposta a colaborar! Me diga o que fazer?
_ Meu nome é Zandra d’Ávila, não esqueça disso, viemos de São João.
_ Nome falso? Para que isso?
_ Questão de vida ou morte, agora fique na tua, vem sempre aqui para estes lados um homem, o nome dele é Igor, para ele eu sou uma escritora de primeira viagem, tu és minha irmã, Antônia, Tonha.
_ Está bem! Mas para que isso? Escritora de primeira viagem?
_ Fique na tua, não vá pôr tudo a perder!
_ Certo...


_ Vou amanhã mesmo até o presídio estadual, quer ir comigo?
_ Vou... mas o que queres lá?
_ Vou te contar amanhã...
Quando o dia amanheceu um táxi parou na porta da casa de Zandra.
O presídio era o lugar mais estranho que ela poderia procurar, porém lá estava, esperando numa sala para ver um prisioneiro: Álvaro.
Ao entrar na sala ele emudeceu, pálido cambaleou até a cadeira:
_ Eu te matei...
_ Não, eu estou aqui e serei teu inferno...
_ Não pode ser!
_ Mas é! Eu sou teu inferno, olha bem para meu rosto Álvaro, olha bem e lembra de quando estava lá no cemitério, morrendo...
_ Não, não pode ser!
_ É Álvaro, a morte é triste, não sou realmente aquela que tu matou, mas sou alguém com o mesmo sangue.
_ Quem é você?
_ Meu nome é Ana Daniken, grave meu nome...
Quando saiu daquela sala Zandra tinha uma certeza, havia vingado em parte a morte de Allanna.
Igor apareceu naquela noite, queria convidá-la para caminhar um pouco pela cidade e conversar, porém foi surpreendido pela visita que Zandra havia recebido:
_ Igor, este é minha irmã Antônia, Tonha.
_ Então tens uma irmã?
_ Sim, ela estava viajando e voltou agora, veio me procurar.
_ Vim te convidar para dar uma volta. Mas se tu não quiser...


_ Claro que sim, espere um pouco...
Quando estavam na pracinha sentaram-se num banco:
_ Vou amanhã procurar por Álvaro, creio que vou me sentir melhor se enfrentá-lo.
_ Não sei, não sou ninguém para te aconselhar , mas creio que não seja boa idéia.
_ Eu irei. Mas não foi por isso que vim aqui te procurar, quero te falar algo...
_ O que?
_ Estive pensando muito em ti, muito mais do que o normal.
_ Não fale assim, sou muito tímida...
_ Boba! Eu quero te perguntar uma coisa.
_ O que?
_ A gente está sozinho aqui, poderíamos ficar juntos.
_ Não sei...
_ Por que não?
_ Sabe, eu fico contigo com uma condição.
_ Qual?
_ Nada do que tu ouvir, verdade ou mentira...vai te fazer me despresar.
_ Nada poderia ser tão grave. Tu matou alguém?
_ Não...
_ Tu tens algum meio escuso de vida?
_ Não...
_ Então não te despreso!
Zandra deixou que ele a beijasse, sabia que nada seria para sempre.
No dia seguinte Igor foi ao presídio, lá encontrou Álvaro:


_ Parece que minha vida está tomada por fantasmas, ela primeiro, agora tu... mortos não me dão paz.
_ Ela quem?
_ Ana Daniken, esteve aqui, era igual a tal que matei, igual, tanto quanto tu és igual a ele.
_ Louco, vai apodrecer aqui!
Igor não podia compreender. Quem seria Ana Daniken? Certamente seria a mulher que ele deveria infernizar com sua vingança. Porém algo o deixava mais intrigado: o nome não lhe era estranho, parecia já ter ouvido em algum lugar, porém onde era algo que sua memória insistia em ocultar. Além de tudo havia Zandra, um rosto que o infernizava e ao mesmo tempo uma mulher que ele insistia em querer cada dia mais.
Enquanto Igor estava perdido com seus pensamentos na cidade de Santa Efigênia...
_ Minha amiga, eu não imaginei que o Igor fosse àquele presídio...
_ Não entendo o que tu pretendes com essa loucura toda.
_ Eles juraram vingança contra as mulheres da famíia Daniken, eu só quero mostrar para ele que isso é uma loucura.
_ Mas para que tu vai te envolver nisso?
_ Tu nunca vai entender Tayse, nunca...
_ Mas se ele descobrir que tu foi no presídio?
_ Não há como, quem foi lá foi Ana Daniken e não Zandra d’Ávila.
_ Nem Ana Saint Louis.
_ Nem Ana Saint Louis...
_ Tudo bem, é possível que tudo termine bem. Mas se ele for um maníaco como o irmão?


_ Bem, não acredito que ele vá levar isso tão a sério...
_ Cuidado...
Quando a noite chegou Igor veio procurar por Zandra, recebido na sala resolveu contar a história para a duas garotas:
_ Uma mulher foi até o presídio, disse que se chamava Ana Daniken, e era igual a Allanna.
_ Pode ser mentira do tal assassino...
_ Não Zandra, o maldito do Álvaro estava tão apavorado com o que havia visto que se via de longe que não mentia...
_ Pode ser delírio dele, sabe, ouvi falar que alguns criminosos enlouquecem. Tonha havia pensado rápido.
_ Não, perguntei ao carcereiro se havia aparecido alguém e ele confirmou, descreveu a mulher.
_ Pode ser alguma parente dela... Zandra via a situação se complicar.
_ Não sei... são mulheres demais com um só rosto. Zandra, tu não foi lá... foi?
_ Na verdade eu fui, não quis te dizer nada porque não achei correto.
_ Mas por que tu foi lá? Igor havia se exaltado por alguns instantes, vendo que o clima esquentava Tonha levantou-se e saiu da sala.
_ Precisava ver o assassino, pretendia entrevistar o tal, mas ele ficou a tal ponto apavorado que não me restou nada além de mentir.
_ Por que Ana Daniken?
_ Tu havia me falado o sobrenome delas, como Anne e Ana são a mesma coisa foi o primeiro nome que me veio em mente, já que ele estava apavorado resolvi me vingar um pouquinho pelas maldades dele.
_ Por um momento pensei que tu me escondia algo mais...


_ Imagine... eu não escondo nada além do que não querem ver.
_ Escuta uma coisa Zandra, eu gosto muito de ti, mas não vou suportar uma mentira destas. Se por acaso eu descobrir que tu és uma delas eu nem sei o que sou capaz de fazer contigo.
_ Esquece isso...
Durante a noite Zandra não pode dormir, sabia que logo Igor descubriria a verdade, na manhã seguinte Tayse a procurou:
_ O que afinal tu tens com essa tal Allanna?
_ Allanna era minha prima, na verdade Paulo iniciou a vingança contra a pessoa errada, ela era apenas descendente dos Daniken...
_ E tu?
_ Bem, a tal Anne Marie era filha de um filho do segundo casamento de meu trisavô.
_ Muito longe esse parentesco.
_ Seria, mas eu além de trineta do avô de Ane Marie sou também sobrinha da avó dela.
_ Como?
_ O senhor Louis Daniken casou-se, pela segunda vez, com uma mulher chamada Aleixa Dechamps, irmã de meu bisavô paterno, assim, sou descendente do primeiro casamento de Louis por parte materna e da segunda mulher dele por parte paterna.
_ Em resumo, tu és prima desta tal Anne mais de perto do que a tal Allanna.
_ E isso me torna mais alvo da raiva dos homens da família do Igor do que ela.
_ Isso é realmente incrível Aninha.
_ Não me chame de Aninha aqui, se alguém ouvir estamos descobertas.


_ Se não fosse tua amiga te deixava aqui sozinha, tenho medo do que possa acontecer contigo e com esse Igor.
_ Não tenha medo, sabemos nos defender... não é verdade amiga?
_ Se estás falando das confusões de nossa terrinha querida... era diferente, não nos ameaçavam de morte.
_ E nem aqui...
Os mistérios que cercavam as duas garotas estavam se espalhando pela cidade, algumas pessoas já havia percebido o quanto Zandra era parecida com Allanna e comentavam sobre uma possível vingança do além.
Todas as noites Igor ia até a casa de Zandra, passava algumas horas lá e depois voltava caminhando para sua casa, era uma rotina tranqüila.
Porém algumas semanas depois de ter ido ao presídio Igor resolveu remexer em seus livros, uma edição caiu sobre seus pés, tomando o livro nas mãos viu que tinha um titulo interessante, folhou um pouco, porém de repente algo o fez parar: o nome da autora.
Era um romance, havia comprado num aeroporto, o nome da autora não estava na capa como o de costume e sim na folha de rosto, somente quando já havia lido todo o livro viu: Ana Daniken. Agora com o mesmo livro nas mãos lembrou da mulher que esteve no presídio, folhou ou o livro mais um pouco e na contra capa viu o que procurava, a foto de Ana e sua biografia.
Ana Daniken era na verdade uma tal de Ana Saint Louis, um nome artístico figurava na folha de rosto e na foto...
A tarde era tranqüila, Zandra cuidava de algumas flores no pequeno jardim quando Igor chegou, parecia enfurecido:
_ Me explica o que significa isso? Jogando o livro no chão ele mal continha sua raiva.


_ É um livro Igor, nada mais.
_ Um livro de alguém que chamasse Ana Daniken ou Ana saint Louis ou seria ainda Zandra d’Ávila?
_Ana Saint Louis...
_ Para que essa farsa?
_ Não é uma farsa Igor, é uma defesa, tu estás louco com essa vingança, não poderia te falar que sou essa escritora aí.
_ E uma maldita Daniken?
_ Uma Daniken sim, uma Daniken e não maldita, malditos foram os homens responsáveis pelas mortes prematuras de minhas primas... estou cansada de te ouvir falar, falar e falar de teus parentes como vítimas, elas sim o foram!
_ Tu realmente é uma vadia como elas!
_ Saí daqui, esta casa não é tua, eu não tenho que te ouvir, e tem mais, nada do que tu me falar ou fizer vai me causar medo. Se Anne ou Allanna eram inoscentes a ponto de se deixar levar por vocês eu não sou. Vá embora!
_ O que tu pretendia aqui?
_ Nada, só acabar com essa vingança  tola, teu irmão se vingou na mulher errada Igor, eu sou a parente mais próxima de Anne.
_ Pro inferno!!!
_ Pro inferno? No inferno deve estar é teu irmão, um assassino...
_ Não pense que estará livre de mim...
_ Não me irrite ainda mais Igor, some daqui! Some antes que eu chame a polícia!
_ Maldita!


Ao vê-lo sair Ana largou-se no chão, sentou-se e cobriu o rosto com as mãos, um turbilhão movia seu coração naquele momento e as lágrimas logo brotaram.
_ Ana, ouvi gritos, o que aconteceu?
_ Ele descobriu a farsa... agora não temos mais porque mentir...
_ E o que tu vai fazer?
_ Por enquanto nada, vou esperar a poeira baixar e procurá-lo, quero que ele entenda que não era uma vingança idiota que eu pretendia.
_ E se ele não entender?
_ Daí será uma vingança, porém uma vingança muito maior do que a dele... te juro Tayse, se ele continuar levando tudo para esse lado eu vou perder a cabeça de verdade.
_ Mais do que tu já perdeu? Está na hora de acordar Aninha, tu está numa cidade estranha, cercada de gente estranha e com um nome falso... tens idéia do que estás fazendo?
_ Não...mas eu bem que gostaria de ter.
_ Não sei, mas acredito que é uma loucura sem conta o que estás fazendo Ana, mas tudo bem! Se tu queres continuar com isso eu só posso ficar aqui e esperar pelo que vier...tomora Deus que nada de mal venha a acontecer.
_ Não se preocupe amiga, se existe raiva nesta história é contra a minha família, tu não tens nada com essa loucura.
_ Mas não te esqueça que o Igor pensa que somos irmãs.
_É mesmo, tenho que arrumar esse estrago.
_ Não irás procurar aquele homem agora! Espere o tempo passar...ele concerta tudo.


Talvez o tempo realmente fosse capaz de concertar muitas coisas, porém nada concerta um coração partido ou traído, os dias passaram sem que nada acontecesse, passaram calmos, calados, mudos por completo.
Faziam três dias que Igor havia discutido com Ana, ela já não esperava que ele voltasse a procurá-la, naquela noite havia saído para caminhar, porém decidiu ir ao cemitério, entrou no malsoléu e ficou ali, sentada sobre o túmulo de Allanna observando a foto de Paulo. Era muito parecido com Igor, podia-se dizer que eram a mesma pessoa, ali naquele lugar, o cheiro das velas trazia um ar de morte. Ver o rosto de Igor estampado numa lápide fazia com que Ana estremecesse. Será que havia falado demais? Será que havia ofendido demais?
Num lapso de atenção ela viu uma sombra se aproximar do malsoléu.
_ Vim te entregar umas coisas das tuas parentas que estavam lá em casa...
_ Como me encontrou aqui?
_ Imaginei que esse lugar te atraísse, atraiu tua prima...
_ E teu irmão... não sei Igor, não sei até onde iremos com essa loucura, mas apesar de tudo eu não acredito que Paulo odiasse Allanna, talvez eles se amassem tanto quanto Anne e Pedro...
_ Como uma maldição que cortou os séculos, paixões que terminaram em morte, amores que nunca se concretizaram...
_ Foi o destino Igor, não foi culpa ou pecado de nenhum... mas esquece, o que há nessas encadernações?
_ Diários, o de Anne e o de Allanna, só não me pergunte o que há neles, nunca os li.
_ Nunca tivesse curiosidade?
_ Não... apenas te entrego eles porque são teus por direito.
_ Está bem...


_ Então adeus, espero que o que está aí não seja pior do que tenho aqui dentro. Igor tocou o peito, fitou por uns instantes o rosto de Ana e virou-se.
_ Igor, espere...
_ Não há mais nada para ser dito...
_ Olha pra mim, por favor, não sou nenhum monstro, me deixa explicar o que aconteceu.
Olhando novamente para Ana, Igor sorriu:
_ O que aconteceu Ana foi simples, eu me envolvi na minha obseção por vingança e tu na tua.
_ Não foi isso! Não de minha parte. Eu apenas quis mudar a história, quis mostrar que não era culpa nossa as mortes.
_ Mas não fez certo, a gente acabou se envolvendo...outra maldição. Não quero que tu te machuque, vamos nos afastar enquanto é tempo.
_ Tu me odeias? É isso, não é?
_ Talvez sim, talvez não, eu não sei o que sinto por ti Ana, Zandra ou sei lá qual teu nome...
_ Deixe que eu te conte a verdade então, depois faça o que quiser...
_ Está bem garota, fale... Igor sentou-se sobre o túmulo de Paulo de forma que fitava ela diretamente nos olhos.
_ Eu sou realmente Ana Saint Louis, uma escritora em início de carreira, tenho um livro lançado, exatamente aquele que tu me jogou nos pés aquele dia.
_ E o que mais tu és?
_ Eu sou simplesmente isso, usei o nome de Ana Daniken naquele livro porque queria algo diferente, algo para chamar a atenção do leitor, a verdade é que quando eu soube da morte da Allanna eu resolvi vir para cá...


_ E como tu soube?
_ Descobri que ela existia por uma árvore genealógica, então nas minhas pesquisas eu descobri essa lenda sobre nossas famílias.
_ Não é uma lenda!
_ O que eu sei é que isso me despertou o interesse em escrever um livro, um relato meio romance meio histórico sobre a eterna briga dos Daniken e dos Salles.
_ Em nenhum momento tu sentiu que isso poderia te levar ao extremo da loucura, quero dizer, que tu faz parte disso?
_ Não, quando eu vim para cá eu não sabia que tu existia. Só usei o nome de Zandra d’Ávila para que o povo não desconfiasse, mas eu não contava que a tal Allanna fosse tão parecida comigo.
_ Queria acreditar, mas isso tudo parece meio fantasioso garota. Por que tanto mistério? Por que não me falou teu nome quando nos conhecemos?
_ Porque tu estava cheio de ódio, de uma vingança tola...
_ Tola? Não, eu sei que tu não achas isso tolice... sabe por que? Porque tu também faz parte de tudo, estamos envolvidos nisso até nossos pescoços.
Ana levantou-se e saiu do malsoléu, por um momento havia sentido algo estranho naquele lugar, respirou um pouco na porta e tornou a voltar:
_ Desculpe-me Igor, mas não posso fazer mais nada. Continuarei aqui como Ana ou como Zandra, depende de ti. Ah, antes que me esqueça: Tonha não existe, o nome dela é Tayse.
_ Outra da tua raça?
_ Não, não somos sequer parentes, talvez seja melhor eu não ter uma irmã.
_ Seria muito azar mesmo...duas de vocês.


_ Igor, eu quero te pedir uma coisa, se tu queres realmente se vingar das Daniken, se tu não vai esquecer essa palhaçada, então por favor, eu te imploro: se vinga em mim, porque eu sou a única que tem o sangue da Anne de verdade, esquece qualquer outra pessoa de minha família, te vinga em mim.
_ O que tu pretende? Me causar pena? Não, eu realmente me vingaria em ti, mas não por me pedir, só por te... Desgraçada! Eu te quero ainda mais agora! Estranhamente Igor levantou-se e foi até ela, puxando-a para si a beijou.
_ Me solta! Livrando-se dele Ana caminhou por alguns metros e tornou a olhá-lo:
_ Para que isso Igor? Se não sentes mais do que ódio por mim! Por que me tocar?
_ Por que não te tocar? Ele aproximou-se.
_ Porque meu sangue te irrita! Porque sou uma mulher descendente da desgraça da tua família!
_ Porque eu quero essa mulher!
_ Vai embora daqui Igor! Vai enquanto ainda há tempo!
_ Por que Ana? Tens medo de mim por acaso?
_ Não!!!
_ Ou então teu medo é de ti mesma?
_ E o que há em mim para que eu tema?
_ Tu que deves saber... não eu.
_ Me deixa ir...
Igor a segurou pelo braço:
_ Não tente fugir de mim Ana, não tente porque agora tu já cruzou meu caminho e de hoje em diante vou te seguir por onde tu for.


_ Só podes ser louco. Me solta! Não tenho nada para falar contigo...
Outra vez ele a puxou e beijou-a, por mais que ela desejasse fugir era como se ele a dominasse, porém empurrando-o ela fugiu.
Voltando ao malsoléu ele sentou-se sobre o túmulo de Allanna e olhando para a foto do irmão começou um monólogo interior:
_ Se ela soubesse meu irmão, se ela soubesse que eu não a odeio e sim amo, amo mais do que tudo nessa vida, mas não posso dizer. Não posso ao menos ser feliz. Eu quero essa mulher, por amor ou por ódio...
Ao chegar em casa Ana encontrou Tayse já dormindo, sentou-se então na sala e começou a ler o diário de Anne Marie, porém uma página lhe chamou atenção em meio a tantas:
Quando conheci Pedro não acreditei que pudesse amar tanto alguém como o amo, mas infelizmente as coisas não estão acontecendo como deveriam.
Meus pais não querem que nos unamos, creio que farei algo para conseguir essa união.
Algumas páginas adiante:
Minha irmã descobriu onde nos encontramos. Minha vida transformou-se num terrível inferno deste dia em diante. Ela está apaixonada por ele, mas sei que não o ama.
Não sei mais o que fazer... não sei nem ao menos se devo continuar. Vou encontrá-lo novamente amanhã, depois sei que viajará por dois longos meses. Creio que morro de saudades.
Por algumas páginas Anne apenas lamuriou-se da distância, até que finalmente escrevia algo que ana não pode deixar de perceber:


Hoje ele chegará, Deus que me ajude! Sei que Katterinne não vai deixar-me em paz, ela está tão mudada, não parece mais minha irmã, vive me rondando, me seguindo. Deus! Como esse amor me fez perder as pessoas!
Sei que Katterinne sabe de tudo!
Estou esperando um filho dele! Vou contar tudo hoje!
Espero que tudo saia bem, mas receio que algo vá acontecer.
Deus! Como meu mundo virou um inferno! As vezes eu não sei se agi certo, porém eu o amo, amo demais. Tenho que ficar junto à ele, é a única forma...não poderão negar-me o casamento ao pai de meu filho. Que esta criança me perdoe, mas quando nascer será o fim do ódio entre duas famílias. Será o fim...
_ Então Anne estava grávida? A irmã não só matou ela como uma criança que ainda não havia nascido!
Por alguns instantes Ana ficou meditando: Pedro devia saber da gravidez, mas nunca falou à ninguém?
Pegou novamente um dos diários, desta vez o de Allanna, dentre muitas páginas somente as últimas falavam claramente no assunto:
Conheci Paulo, parece envolvido com a vingança contra as Daniken, ficou maluco quando descobriu que eu era uma delas.
Ele pretende derrubar os túmulos, mas eu não vou deixar, custe o que custar.
Mais adiante ela escrevia a última página de um diário incompleto:
Ele enlouqueceu mesmo, hoje disse que ia me matar e se matar depois, porém não o fez... me beijou e não quis mais me matar.
Mas confesso que fiquei com medo quando ele ameaçou nos atear fogo.
_ São loucos! Essa é a resposta! Como não percebi antes? Mas agora o que posso fazer então?


Ana passou boa parte da noite conversando com as paredes pretendia descobrir um meio de encerrar toda a história em poucos dias.
_ Ana, acorda logo e desce rápido aqui no jardim!!!
Os gritos de Tayse acordariam não somente Ana mas quem estivesse por perto.
Quase voando desceu as escadas e foi ao pequeno jardim em camisola:
_ O que foi Tayse?
_ Esse louco estava querendo invadir a casa, disse que iria falar contigo nem que arrombasse a porta.
Ao ouvir as explicações de Tayse Ana olhou para um canto do jardim e viu entre algumas árvores Igor, ele tinha um ar de superioridade estampado no rosto e ao vê-la sorriu:
_ Que maravilha! Veio bem rápido me atender!
_ Vá pro inferno! Se quer falar comigo espere que me troque. Oras, pensei que a casa pegava fogo e ao chegar aqui vejo um insignificante louco.
_ Louco sim, e tu ainda irás ver de quais loucuras sou capaz!
Igor jogou a ameaça sem mudar seu sorriso, ao ver Ana voltar para a casa ignorou a presença de Tayse e pôs-se a remexer um pé de azaléias:
_ Escuta aqui seu grosso, o que tu pensa que faz aqui? Tu não mandas em ninguém aqui não!
_ Escuta tu garotinha metida, meu negócio é com tua amiguinha, mas não tenta cruzar meu caminho que vai sobrar pra ti também.
_ Não me ameaça!
_ Usar nome falso é crime, tua amiga deveria ter te alertado sobre isso.
_ Assassinato também é crime e nem por isso teu irmão estava preso! Tayse levantou o tom de voz e falou como se fosse a dona da verdade.


_ Vadia... Igor levantou a mão para agredi-la, porém a segurou pelo braço e a empurrou contra uma das árvores:
_ Não tente me desafiar, eu te mato!
_ Mata quem Igor? Vai virar um assassino como teu irmão? Se vai, avisa, porque daí eu vou te mostrar que nós duas não somos tão tolas quanto parecemos.
_ Aninha, esse cara é louco! Tayse livrou-se dele e foi para perto da amiga.
_ Louco como os outros dois, sabe Tayse, Anne Marie não morreu só, esperava um filho do maldito Pedro e Allanna quase foi queimada pelo louco do Paulo. Quem me garante que não foi realmente Pedro o assassino de Anne?
_ Vim aqui falar contigo sobre os diários...
_ Eu li tudo, melhor que não tivesse lido, assim não estaria com a certeza que estou: família de assassinos.
_ Aninha, é melhor irmos embora daqui, esse louco pode querer nos matar!
_ Não Tayse, ele não vai nos matar, pode me matar sim, mas terá que morrer também. Ouviu Igor?
_ O que estás falando sua louca?
_ Para acabar com a maldita história temos que morrer juntos, ao mesmo tempo, por isso que teu irmão quis queimar Allanna e ele juntos, só a morte de dois de nós pode apagar tudo, ou caso contrário outros descendentes virão.
_ Ótimo! Maravilhoso! Então vamos para a minha casa, vamos atear fogo na casa e morrer juntos!
_ Pro inferno Igor! Pro inferno tuas idéias! Ana deixou Igor plantado seguida por Tayse.


Igor sabia da existência de uma velha cabana, seu irmão encontrara apenas ruínas, mas havia reconstruído em detalhes em meio a mata, era o lugar onde Pedro e Anne encontravam-se.
A velha cabana lhe fez pensar em algo muito mais assustador do que o simples incendiar uma casa como seu irmão havia pensado...
Naquela tarde Ana havia resolvido caminhar um pouco, não viu ou pode reagir, apenas sentiu um lenço úmido cobrir seu rosto...
Ao acordar não pode compreender exatamente o que estava acontecendo, sua cabeça pesava, ao conseguir erguer a cabeça viu que o lugar era iluminado por um lampião de gás, tonta mau conseguiu sentar-se, percebeu que estava sobre uma esteira, ao seu lado alguém sorria friamente:
_ Igor?
_ Cadê os gritos?
_ Me deixa sair daqui...
_ Não senhora! Agora eu comando a situação minha princesa...essa cabana era o lugar onde Pedro e Anne encontravam-se.
_ E eu com isso! Ana havia recobrado os sentidos e saltou da esteira.
_ Calminha... Igor apontou um revólver para ela.
_ Agora estás te revelando!
_ Estou! _ Igor a segurou _ A cabana está trancada com cadeado...as chaves estão escondidas, não há saida.
_ O que tu quer?
_ Volta para a esteira, senta e fique quieta!
Ana voltou para a esteira.
_ Muito bem _ Igor sentou-se ao seu lado _ agora vamos ter uma conversa.


_ Não temos o que conversar!




_ Eu te falei sobre a cabana, agora vou te dizer mais uma coisa, nós dois vamos morrer, como tu me sugeriu.
_ Não!!!
_ Vou atear fogo aqui e nós dois vamos morrer juntos, acabando com nossa descendência.
_ Por favor, pare!
_ Por favor? Onde está a garota que não tinha medo de nada?
_ Não quero morrer!
_ Mas eu quero, sabe por que?
_ Não...
_ Eu não posso te amar ou te possuir, a maldita vingança me impede e isso significa que nunca serei feliz, prefiro a morte e não vou te deixar para que outro te ame!
_ Igor...
_ Nada do que disser vai me impedir.
_ Eu não te odeio e não me importo de ser tua...
Ao ouvi-la ele a beijou, não havia um real motivo para odiá-la.... não havia outra forma de fugir, Ana se entregou à ele, mortos ou vivos eram destinados à um só caminho.
_ Por que se entregou desta forma?
_ Igor, tu ias me matar, mas eu não te odeio.
_ Está bem, queres me deixar louco mesmo... vamos, te levo para casa...


Realmente ele a levou. Assim que o dia amanheceu Ana acordou Tayse as pressas:
_ Temos que ir embora daqui o mais rápido possível.
_ Por que isso agora Aninha?
_ Temos que ir, eu pretendia ficar dois meses nesse lugar, mas ontem cheguei a conclusão de que devemos sair e hoje mesmo, já liguei pedindo um táxi.
_ O que aconteceu ontem a noite?
_ Nada! Esqueça tudo o que aconteceu nesta cidade, temos que ir, só isso.
_ E o Igor?
_ Igor não vai nos impedir.
A loucura de Ana para sair de Santa Efigênia assustou um pouco Tayse, porém não o suficiente para que a impedisse de ir.
Desde aquele dia seis longos anos se passaram, seis anos em que Ana jamais pensou em voltar à Santa Efigênia, porém era preciso voltar e concertar tudo o que havia ficado para trás, concertar os erros, desta vez havia convencido Tayse a voltar, porém não chegou com um falso nome ou com uma falsa intenção, queria terminar o que havia deixado pelo meio.
_ Voltar aqui depois destes anos me trás tantas recordações...
_ Nunca entendi o que te fez partir daquela forma...
_ Aquela tarde e aquela noite Tayse...
_ Então realmente aconteceu algo?
_ Aconteceu, Igor me raptou, disposto a me matar, fomos para uma cabana e lá... bem, o que importa é que ele não me matou, porém eu preferi fugir.
_ Muito estranho tu fugir, justo tu...
_ As vezes a gente age com a cabeça e esquece que o coração pode pagar.
_ Não foi só isso que te fez fugir...


_ Não, naquele tempo eu estava apaixonada por ele Tayse, demais para pensar, por isso fugi, para não cometer nenhuma besteira.
_ E hoje, se tu encontrasse ele, o que farias?
_ Nada, o tempo cura até mesmo um mal de amor, eu o esqueci, esqueci de tudo...
_ Então por que estamos aqui?
_ Para terminar meu livro...
Mal sabiam as duas que naquela cidade o destino reservava todas as surpresas do mundo para ambas...
Dias depois de chegarem na cidade outro forasteiro apareceu, um homem jovem, um destes galegos esbeltos que se encontram em quase todo canto do mundo, logo que chegou aproximou-se de Tayse e não demorou para que começacem a manter uma relação além da amizade.
Mais de um mês havia se passado, Ana estava com o livro concluído, Tayse estranhamente adoeceu, teve de ir à cidade grande fazer alguns exames...
Justamente naquela época o galego sumiu, seu nome era Marcos, sumiu como chegou na cidade, do dia para a noite.
Alguns dias depois do sumisso Ana resolveu descobrir a misteriosa doença de Tayse:
_ O que há contigo Tayse?
_ Nada...
_ Me responde com toda sinceridade, estás grávida?
_ Estou... mas o que posso fazer? Marcos simplesmente sumiu...
_ Marcos era um estranho, mas alguém deve saber o que fazia aqui, vou descobrir.


Não levou muito tempo para que Ana descobrisse que Marcos era um dos melhores amigos de Igor, havia estado na cidade já outras vezes com Igor.
Como Marcos sumiu Igor voltou, uma bela manhã encontrou Ana no mausoléu, sentada sobre o túmulo de Allanna:
_ Voltou para ficar Ana?
_ Não, voltei somente para terminar o que havia começado...
_ Tem certeza?
_ Refiro-me ao livro.
_ E o que mais tu começou?
_ Nada, nada que não tenha terminado.
_ Eu soube que tua amiga também voltou...
_ Voltou, deves mesmo saber, o cretino do teu amigo a deixou...
_ É, ele me falou, me contou que a deixou grávida.
_ Que lindo né? Tu é um vagabundo, e teu amigo mais ainda.
_ Quem mandou tua amiga se entregar assim para um estranho? É um costume perigoso, sabia?
_ Não me diga! É um costume de vocês engravidar as mulheres e as deixar também?
_ Não... só aquelas que são fáceis demais.
_ Pois eu vou te contar uma coisa, não é sempre que se vai para cama com um homem que se entrega à ele...
_ Ah, não?
_ Não, quando se faz isso para se livrar dele se faz com nojo e não com desejo.
_ O que há? Estás querendo me dizer que tu não queria?
_ Por acaso eu nem me recordava disso, não me recordo de coisas asquerosas.


_ Tu não sabes mentir Ana... voltou aqui para me encontrar novamente, não te preocupa, eu não te esqueci ainda.
_ Mas eu te esqueci...
_ E da vingança?
_ Já terminou, tu me fez fugir daqui por estar enlouquecendo, foi o suficiente. Mas eu voltei Igor, e não pretendo deixar isso pela metade desta vez.
_ Nem eu...
_ Diga ao teu amigo, que a minha amiga não precisa dele para ter esse filho, principalmente porque eu não a deixaria cair nas mãos de um homem que tenha o mesmo caráter que tu.
_ Mas esse mal caráter aqui já foi teu homem.
_ Passado, só isso.
Igor e Ana não tornaram a conversar, passavam um pelo outro como perfeitos estranhos. Os meses passaram, Ana voltou à sua cidade, Tayse ficou sozinha, quando estava quase na época do bebê nascer Ana voltou para ficar com a amiga...
_ Não sei Aninha, mas sinto algo estranho...
_ Bobagem!
_ Marcos voltou a me procurar, vai registrar o bebê, não brigamos, entramos num acordo.
_ Isso é muito bom amiga.
_ Quero que me jures algo...
_ O que?
_ Se algo acontecer comigo tu ficarás com meu filho e o criarás como se fosse teu.
_ Mas nada vai acontecer...


_ Jura?
_ Juro...
Alguns dias depois nasceu uma bela menina que recebeu o nome da mãe.
Tayse não aceitou a criança, chamou por Marcos e Ana e pediu:
_ Por favor, quero que minha filha fique com Ana, se algum dia tu quis bem essa criança deixe-a com ela Marcos.
_ Não fale mais Tayse só podes estar louca... Marcos não entendia.
_ Ana, eu sei que vou parecer má, mas não é isso, me ajude...
_ Está bem, a menina ficará com ela Tayse... Marcos havia ficado horrorizado.
A menina ficou em poder de Ana, esta mudou-se definitivamente para Santa Efigênia e não mais voltou para sua cidade, o que ganhava com seus livros poderia mantê-la e a menina.
A criança ficou registrada em nome de Tayse e Marcos como ele havia prometido, porém ele logo sumiu.
_ Ana, não entendo porque tu ficou com essa criança, não é tua responsabilidade.
_ Eu sei dona Marta, mas Tayse era minha amiga, não posso deixar de cumprir com minhas promessas, além do mais Marcos não seria um bom responsável, é o pai, mas não substituiria uma mãe.
_ E quando tiveres teus filhos?
_ Preciso encontrar um pai para eles, Tayse será minha filha, e quem me quiser terá de saber disso.
A atitude de Ana havia afastado as provocações de Igor, vendo a garota se responsabilizar por uma criança e largar tudo por ela o deixou pensativo, porém um dia voltou a procurá-la:


_ Vim te dizer que esqueci por completo a história de nossas famílias, é só um sobrenome, nada mais.
_ Fico feliz com isso Igor, principalmente porque não estou disposta a continuar com os nossos jogos.
_ Eu sei, tens a menina agora...
_ É, Tayse é uma responsabilidade a mais, preciso deixar de lado as aventuras.
_ Sabe, quando o Marcos me falou da criança eu cheguei a sentir inveja, ela não imagina o quanto eu queria ter uma família, e ele tem e deixa...
_ Marcos é uma criança grande como era a minha amiga.
_ Mas dessas crianças grandes agora existe uma criança de verdade... não dá para ser irresponsável como o Marcos.
_ Talvez os dois tenham lá suas razões...
_ E tu larga tua vida por isso?
_ Não sei nem ao menos o que faço... eu sou assim mesmo.
_ E se um dia tu casares?
_ Terá de ser com um homem que aceite Tayse.
_ E ela nunca vai saber de quem realmente é filha?
_ Não, prefiro que nunca saiba.
_ Ana, eu te fiz muito mal, mas quero te ajudar, ao menos reparar parte do que fiz, a menina está registrada como filha de Tayse e de Marcos?
_ Está...
_ Isso dá à eles o direito de tomá-la de ti quando quiserem, se tu a registrares como tua...
_ Aí ela não terá um pai...
_ Eu assumo esse papel, assim a menina será nossa filha.


_ Não! Isso não!
_ Por que não?
_ Porque não, ela não é nossa filha, nossa filha...
Num repente Ana começou a chorar.
_ O que aconteceu contigo?
_ Igor, eu tenho que te contar uma coisa que jamais ninguém soube e que talvez seja o motivo pelo qual eu estou com a menina e porque voltei.
_ O que aconteceu?
_ Depois que fui embora, eu fui para te esquecer, mas quando cheguei em minha cidade, algum tempo depois, descobri que esperava um filho teu.
_ Um filho? E o que aconteceu com esse filho?
_ Eu não contei à ninguém, tive medo, um dia comecei a passar mal, perdi o bebê... nunca contei á ninguém.
_ Mas por que te culpas então?
_ Eu talvez deveria ter falado, ter procurado um médico e nada teria acontecido.
_ Não pense desta forma, o que aconteceu deve ter sido um erro da natureza, um erro que nos custou um filho.
_ Por isso fiquei com a Tayse, para tentar esquecer meu filho.
_ Nosso filho... mas não te culpa, não te condena por algo que não foi tua culpa.
_ Igor, eu fiquei pensando no que seria deste filho, se ele existisse... o que tu faria?
_ Ana, se tu perdeu nosso bebê não foi por culpa nossa, mas eu certamente o iria querer, Marcos abandonou Tayse porque os dois só haviam tido uma relação passageira, mas eu te amava, agora posso te falar, mesmo que não tenhamos mais chance.


Igor e Ana começaram a manter uma amizade sincera desde aquele dia, porém quando Tayse, Tatá como a chamavam, tinha seis meses a mãe voltou:
_ Me arrependi de ter deixado ela Ana...
_ E agora vais me tomar a menina?
_ Vou...
Avisado por um empregado da chegada de Tayse Igor havia ido até a casa de Ana, encontrou-a desolada:
_ Tayse levou a menina para a pousada.
_ Mas como pode ter feito isso?
_ Com o direito dela...
_ Vou chamar Marcos, ele tem que opinar.
Igor chamou seu amigo, contou-lhe em detalhes o que havia acontecido e os motivos pelos quais Ana queria tanto a menina, Marcos procurou então por Tayse e lhe chamou atenção...
Na mesma noite Marcos e Igor estavam na casa de Ana quando Tayse adentrou furiosa:
_ A minha filha tu não vais tirar Ana. Nem tudo pode ser teu quando tu queres!
_ O que tu estás dizendo Tayse?
_ Isso mesmo Ana, ela é minha filha e não tua!
_ Tayse, cale-se! Marcos havia tomado partido.
_ Não, Ana, se tu perdeu teu filho o azar é teu, essa menina é minha... o filho que tu perdeu era desse vagabundo aí.
_ Tayse, Ana cuidou da tua filha porque tu não a queria, me admira que agora venhas aqui e queiras lhe dar  lição. Igor não queria que magoassem Ana.


_ Vou levar a menina, ela não vai ficar com vocês! Ana, queres um filho? Arrume outro com o Igor, afinal os dois não são santos. Tu me criticou por estar com Marcos, mas também havias estado grávida do Igor, tu não presta ou presta menos do que eu. Será que não abortasse?
Ana perdeu o controle e acertou um tapa no rosto de Tayse:
_ Nunca diga isso Tayse! Eu nunca faria isso, não sou como um animal que mata ou abandona a cria, ou melhor, tu és pior do que um animal, porque os bichos não tem consciência dos atos e mesmo assim amam seus filhos. Tu não presta! É uma cobra, uma cobra que eu devo ter ajudado a se envenenar! Pois saiba que se depender de mim tu não ficas com a Tatá, Marcos que fique, eu sei que a lei não me dará a guarda, mas tu não a terás também. Quem me garante que não queres vendâ-la?
_ Deixa de ser fingida!
_ Fingida eu? Não Tayse, fingida és tu, mas vai, leva a menina, eu não vou te impedir, mas também nunca mais me procure, e quando ela crescer conte para ela que tu a abandonou e só veio buscá-la para se fazer de vítima.
Quando Tayse saiu seguida por Marcos que ainda insistia em ficar com a menina Ana desandou a chorar:
_ Não chora, a menina não era tua, tu fez tudo o que pode, agora deixe que Tayse cuide dela.
_ Não Igor, eu sei que ela quer a menina para dar para alguém.
_ Que seja! Infelizmente não somos nós os responsáveis legais, mas saiba que eu acredito em ti, nada do que ela disse sobre nosso filho me atingiu.
_ Obrigada igor! É bom saber que apesar de tudo o que já aconteceu de ruim em nossas vidas, pelo menos uma coisa de bom eu vou poder levar comigo: o fim da vingança.


_ Realmente já não me interessa essa vingança tola, mas por que tu disse levar contigo?
_ Vou embora amanhã mesmo...
_ Mas por que?
_ Eu vim para cá resolver as coisas pendentes, queria continuar meu livro, terminei-o, queria te falar a verdade sobre a minha partida, falei, depois eu quis ficar aqui por causa da Tatá, não podia chegar em minha cidade com uma criança, todos saberiam que não era minha e não podia dizer que era de Tayse, ela não havia falado nada para a família.
_ Mas agora que a menina voltou para a verdadeira mãe não é preciso que te vás...
_ Creio que sim Igor, já não há mais nada para fazer aqui, perdi a menina, meu livro já está pronto a tempo e editado, meu filho não se gerou, a nossa história de família já está resolvida, enfim, se havia uma missão para mim aqui em Santa Efigênia esta missão acabou.
_ E eu? Como fico nessa história? Não sou o livro, não sou responsável pela menina e meu filho também não se gerou, porém eu existo, sem querer mais te matar, sem recordar de todo ódio que nos uniu.
_ Igor! De ti eu só levarei uma recordação: o pai de meu filho, ele pode não ter nascido, mas existiu para mim e eu o teria criado com amor infinito.
_ Não quero ser o pai de um filho que não nasceu, quero mais, não é justo que cada um vá para seu canto depois de tudo o que houve.
_ E o que tu queres que eu faça Igor? Não posso continuar aqui em Santa Efigênia, não tenho nada que me prenda aqui, nada. Na verdade eu acho que não deveria ter voltado, ou melhor, não deveria ter vindo para cá, teria poupado tanto sofrimento, teria me ferido muito menos, não teria que chorar como chorei tantas vezes pelos cantos.


_ Se tu não tivesse vindo para cá nada teria sido como foi, quando vim procurar a história de meu irmão eu não queria te encontrar, não, mas te encontrei.
_ E me odiou a primeira vista!
_ Não, te amei desde o primeiro instante que te vi, amei a Zandra d’Ávila que nunca existiu, mas tu não sabes a importância disso para mim Ana, quando descobri quem era a tal de Ana Daniken tudo desmoronou para mim, eu havia jurado me vingar de uma mulher e agora ela era a mulher que eu amava.
_ E eu havia vindo para cá narrar a história de um passado distante, de um assassinato recente e de toda uma estirpe de mulheres que me deram origem, tinha certo em meu coração que os homens da família Salles eram os culpados pela eterna desgraça das Daniken, mas tinha ainda o desejo de terminar com esse ódio provando que tudo pertencia ao passado, mas ao chegar aqui, com um nome falso, uma história falsa eu me deparo com um homem que me seduz aos poucos, porém esse homem é um Salles e eu uma Daniken.
_ Passado, tu mesma disse.
_ Passado, Anne morreu, Allanna morreu e eu escapei da morte me entregando ao meu quase assassino, fujo e descubro que levei comigo um filho dele.
_ Só que ele não ia te matar, apenas te queria e havia jurado que ia te possuir, por amor ou ódio.
_ Não vem ao caso, agora acabou.
_ Não, Ana, eu quero continuar, não quero que seja o fim, fica.
_ Para que? Para lembrar sempre de tudo?
_ Eu não quero esquecer, fique, por favor, vamos recomeçar.
_ Já recomeçamos Igor, já não somos inimigos, construímos uma amizade.
_ Mas não quero ser teu amigo! Entenda! Não quero tua amizade depois de ter sido mais que isso!


_ Por favor...
_ Não! Não! Desta vez tu não irás fugir! Igor a puxou para perto de si e a beijou.
_ Igor, não devemos mais continuar com isso, estamos fadados ao nada.
_ Não! Estamos começando um tudo, uma nova história.
_ Para que nos enganarmos assim?
_ Te amo, ouve o que te digo, eu te amo.
Ana estava chorando novamente, seu coração estava sufocado, queria fugir mas não podia, algo a prendia naquele lugar.
_ Não chore, por favor! Não quero mais tuas lágrimas.
_ Não estou chorando por estar magoada contigo, estou chorando por te amar também, mas tenho medo de errar outra vez.
_ Fica...
_ Não, infelizmente não posso.
_ Esta noite ao menos me deixe ficar aqui...
_ Está bem, não posso negar nada, nada...
_ Deixe eu te amar, não como a vez em que te magoei tanto, mas como realmente eu desejava.
_ Igor... não me deixe mais triste...
_ Te quero, te amo, não me negue isso.
Ana sabia que ele era sincero, outra vez entregou-se, porém dois dias depois partiu de Santa Efigênia.
O amor não parecia conseguir florir entre aqueles dois, porém o tempo pode curar tudo e fortalecer, ou enfraquecer, qualquer sentimento.


Haviam alguns meses que Ana havia ido embora, Igor continuava em Santa Efigênia, porém cansado de tudo adoeceu gravemente, sem parentes para avisar alguns vizinhos resolveram chamar por Ana.
No hospital Igor não parecia mais o mesmo homem, era um farrapo, numa cama do isolamento vegetava, os médicos informaram à Ana que ele estava assim a dias, não falava, não comia, ficava com os olhos fixos no teto do quarto sem ao menos voltá-los para ver quem chegava ou saia do quarto.
Ana recebeu permissão para ficar a sós com ele, ao entrar no quarto sentiu seu coração apertado, sentou-se na cama e segurou-lhe a mão:
_ Igor, o que está acontecendo contigo?
Não houve resposta, os olhos dele nem ao menos voltaram-se.
_ Por favor, não faça assim comigo, vim até aqui para te ver, para te contar algo sobre nós... algo tão maravilhoso para mim, mas que não vai ser tão completo se tu não me deres atenção. Igor, me ouve, olha para mim...
O silêncio estava desesperando Ana:
_ Será que eu não significo mais nada para ti? Será que nada do que aconteceu entre nós te faz ao menos olhar para mim? Igor... vou embora, vou para a minha casa, voltarei amanhã, se não tiveres melhorado eu partirei e desta vez para sempre e tu nunca irás saber o que tenho para te contar sobre nós.
O dia passou sem nada de novo, na manhã seguinte Ana foi chamada ao hospital. Igor estava falando e não parecia o mesmo, ao entrar no quarto Ana encontrou-o pronto para ir embora:
_ Vejo que tua doença curou-se rápido.
_ Talvez o remédio certo tenha vindo para mim...
_ Estás indo para casa?


_ O médico disse que não preciso ficar aqui, eu estou bem...
_ Então até qualquer hora, apenas vim te ver.
_ Vem comigo para a minha casa?
_ Para que? Estás bem agora, posso ficar na minha casa e me preparar para voltar para minha cidade.
_ Não foi o que tu disse ontem...
_ E o que eu disse?
_ Vamos lá para casa, quero ouvir tudo o que tu tinhas para me dizer.
Na casa de Igor Ana foi logo recebida com perguntas:
_ Qual a novidade que tens para me contar?
_ Não imaginas o que tenho para te falar?
_ Não, de ti eu espero qualquer coisa, um novo nome, um adeus, ou até mesmo um eu te amo mentiroso...
_ Nada mais?
_ E o que mais posso esperar ouvir de ti? Posso te amar, te querer mais do que tudo, mas continuas sendo um mistério para mim, eu só sei que és a mulher que eu mais quis neste mundo.
_ Eu quase ia me esquecendo, encontrei a Tatá, está com a avó, a Tayse realmente não quis a menina... e depois eu é que não prestava.
_ Um dia tu vai ter teus filhos, então poderás ficar com eles e dar à eles todo amor que tu ias dar à essa garotinha.
_ Um dia... sabe Igor, a primeira vez que eu fugi daqui fiquei desesperada quando soube que estava grávida, não sabia o que fazer, afinal era um filho sem pai e mesmo assim eu o quis, agora porém eu quero muito ser mãe, mais do que quis da primeira vez...
_ O que tu disse?


_ Desta vez não vim te dizer outro nome, não vim escrever nenhum livro ou mentir, muito menos fugir de ti e te deixar um adeus... vim te dizer que outra vez fugi daqui com um filho teu, três meses e está tudo bem, desta vez eu procurei um médico...
_ Tu está grávida? Um filho meu?
_ Acho que sim, se não for teu... deve ser de algum fantasma.
Igor a segurou pela cintura, louco ajoelhou-se e erguendo a blusa dela pôs-se a beijar sua barriga.
_ Igor! Não é para tanto, só vim te dar a notícia!
_ Veio e não vai mais... desta vez tu vai ficar nem que eu tenha que te amarrar.             
-Está bem Igor... está bem.
Algum tempo depois nasceu Otávio Daniken Salles, a união das duas famílias por um amor que havia começado no ódio.
A verdade é que no mundo nada é estático, o que hoje parece amanhã pode ser e o que hoje é amanhã pode só parecer. Ana e Igor viveram felizes na medida do normal em Santa Efigênia, nasceram outros filhos desta união, porém nunca deixaram de contar aos seus descendentes a história que os uniu.
Tatá cresceu, assim como Otávio, o que foi impedido por Tayse em sua ganância o destino uniu em forma de um neto... queira ou não queira o que há de ser é!

Nenhum comentário:

Postar um comentário