sexta-feira, 29 de abril de 2011

— Por onde andou?
— Estive no jardim, preciso respirar. Sabia que não sou um vegetal?
  Por tanto tempo no jardim?
— Por favor Aléc, não me incomode com suas perguntas, tenho muita coisa para digitar.
— A quem tu pensas que enganas Taemy? Eu ouvi quando a moto do Hudson parou nos fundos da base.
— E daí? O que tem isso de errado? Ele não é um de vocês?
— Hudson não é o santinho que tu estás pensando...


— Não busco santos para meus amigos, ele apenas não vive de mal humor como tu vives e isso basta.
— Ele é um ladrãozinho de quinta que tiramos da prisão e trouxemos para cá.
— Um ladrãozinho que interessou vocês por ser um arrombador de cofres... e eu Aléc, o que interessou vocês? Não cometi nenhum crime e não sei fazer nada de ilegal, o que tu pensas que poderei fazer na organização?
— Simples minha cara, essa tua cara de santinha vai ser muito útil para nós na missão que vamos encontrar amanhã.
— Amanhã?
— Estou aqui para te buscar, vamos tratar de montar a tua personagem nessa história toda, é para isso que tu serve Taemy, para mentir, como uma atriz...
— E o que querem que eu faça nessa missão?
— Vamos para uma cidade do interior, como perfeitos estranhos, eu e tu...
— Porque tu?
— Porque eu sou teu parceiro nessa organização, digamos que tu foi um presentinho que eu recebi da ACO por ter sempre sido um bom agente.
— E o que vamos fazer nessa cidadezinha?
— A ACO soube de umas coisas muito estranhas que estão acontecendo por lá e nós dois vamos descobrir o que está causando essas coisas estranhas.
  Aléc, coisas estranhas podem ser muitas coisas, se tu não me falar exatamente o que tu queres dizer eu não vou poder adivinhar.
— Está bem, vamos conversar sobre isso, mas não aqui na base, já que tu quer sair, vamos jantar fora hoje.


— E se eu não quiser?
— Tenho uma surpresa para ti essa noite.
— O que tu quer dizer com surpresa?
— Tu és muito importante para a ACO, um dia tu vai descobrir porque, por isso não queremos que tu fiques depressiva. No mais eu te falo logo a noite.
Aléc era especialista em me deixar nervosa!
Quando chegou a noite eu fui levada por um chofer até um restaurante, lá Aléc já me esperava, até aí tudo estava normal, sentamos e ele começou a me falar sobre a missão:
  Trata-se de uma cidade do interior, uma cidadezinha pacata, mas uma coisa estranha está acontecendo.
— Que coisa?
— Os moradores estão sendo assolados por uma criatura estranha, animais andam aparecendo mortos, luzes no céu, a velha lenda do chupa cabras ataca novamente e com força total.
— E tu acredita que são ETs?
— Não, talvez não sejam eles, e sim terráqueos querendo que a gente pense isso, mas de qualquer forma precisamos descobrir.
  E o que eu faço nisso?
— Tu vai ser uma fazendeira, compramos um terreno por lá e colocamos no teu nome, se puxarem tua ficha não vão encontrar nada de errado, tu és uma boa menina...
— E o que isso vai ajudar na missão?
— Uma fazenda de gado é um prato cheio para o chupa cabras, não acha?
— Claro! Isso é verdade!


— Eu vou estar por perto, vou ser o novo hóspede da pousada, junto com o Hudson, afinal, apesar dele ser um ladrãozinho de quinta categoria é um ótimo ator.
— E vão me deixar sozinha nessa fazenda?
— Ora! Não me deixou terminar, deixe eu te dar a surpresa antes de começarmos a jantar, eu trouxe uma colega para ti, ela será a tua irmã mais nova...
— O que?!!!
— Sun Shine, traga a amiga dela... Aléc ordenou ao chofer, dentro de alguns minutos ele voltava com uma pessoa.
— Aléc, o que tu fez? Eu levei um susto ao ver a minha nova colega.
— Sente-se Paola... Aléc pediu.
— Paola? Eu ainda estava chocada.
— Quando te raptamos,  raptamos ela também, mas não falamos antes para não te deixar calma e perder o teu treinamento, Paola vai ser a tua falsa irmã nessa história. Aléc explicou.
— Mas se ela sumiu na mesma época que eu o povo deve ter sentido a falta da gente. Tentei raciocinar.
— Não, todos pensam que as duas estão na capital do Estado de vocês estudando, tudo aqui é medido, nada saí errado.
— Aléc, eu não sei até onde isso pode dar certo, não sei se vou conseguir fingir por tanto tempo. Paola reclamou.
— Paola tem razão Aléc, nós não somos deste ramo, podemos tropeçar nas palavras.
— Não Taemy, eu sei que não vão causar dano algum à ACO, porque se causarem as famílias de vocês vão pagar caro....


— Tu não perde por esperar Aléc...Falei meio sem pensar.
— Eu sei, mas espero muita coisa... Ele nem ligou para a minha frase.
Naquela noite ele nos levou para a base e nos hospedou no mesmo quarto, segundo ele nós deviamos ter muito o que fofocar.
— Paola, isso é o inferno, temos que sair dessa!
— Eu bem que tentei, argumentei, esperneei, gritei, chorei, mas nada foi capaz de apaziguar o tal de Alexander.
— Fostes marcada?
— A ferro e fogo, bem nas costas, uma dia me deram uma anestesia e fizeram a marca, ficou horrível.
— Fui marcada na perna, mas sem anestesia, me acorrentaram e Aléc queimou-me, disse que isso era serviço de especialista mas que ele fazia questão de me marcar como se fosse gado dele.
— Esse Aléc parece problemático.
— Louco, desenfreado, o que já me torturou nesse último mês...
— Pouco encontrei com ele, somente quando estava com Alexander e ele aparecia.
— Tive a infelicidade de ter ele sempre por perto, dele estar sempre me atormentando, resmungando. Quando me queimou foi algo que nunca pude entender, parece que ele sente prazer em me fazer sofrer.
— Eu ouvi ele falar com Alexander por algumas vezes, mas nunca entendi nada, falam por algum código.
— O que vamos ser obrigadas a fazer?


— Por nossas famílias Taemy, por elas te controla e não faz nenhuma besteira, não provoca o Aléc.
— Está bem, verei até onde posso suportar.
Assim que o dia amanheceu Aléc e Hudson apareceram na base, nos disseram que iriam para a tal cidade e que nós deveríamos ir mais tarde direto para a tal fazenda.
Fazer o que? Obedecemos cegamente.
Somente quando cheguei a tal fazenda pude ter idéia do que ele queria, era um lugar paradisíaco, cercado de montanhas maravilhosas, ar puro e muitos, muitos animais, gado gordo, pasto verde e cavalos que reluziam o belo pêlo.
— Paola, isso aqui vale um bom dinheiro, a ACO além de tudo é muito rica mesmo.
— Estás maravilhada com isso não é?
— Sempre gostei de fazendas...
— Quando será que o Aléc e o Hudson vão aparecer por aqui?
— Quem sabe? Pode-se esperar de tudo quando o assunto é Aléc.
Aléc havia se hospedado junto com Hudson, haviam se registrado em horas separadas, Aléc como veterinário, o que facilitaria sua circulação na fazenda e Hudson como um escritor curioso.
Disfarces a parte o dia passou sem maiores acontecimentos.
Por alguns dias um não ouviu falar do outro, elas na fazenda e eles na pousada, porém um belo dia Paola resolveu ir até a cidade, tinha que comprar algumas coisas e acabou por convencer-me que deveriamos ir juntas, afinal era um lugar estranho.
Tentativas e tentativas e acabei indo com ela.


Quando chegamos na cidade encontramos logo de cara com Hudson, ele apenas sorriu discretamente e passou por nós sem falar.
Porém no mercadinho topamos com Aléc, cara amarrada, jeito de quem não nos conhecia.
— O que devemos fazer? Paola não sabia mesmo como reagir.
— Não sei, vamos fingir que não o conhecemos, se ele precisar de nós tentará uma aproximação.
Quando já estavamos no caixa, pagando as nossas compras ele se aproximou, meio que de esgueio, meio sem parecer que queria conversa.
— Olá, sou o novo veterinário da cidade, soube que são as donas de uma fazenda de gado.
— Sim, somos. Paola respondeu sem nem ao menos voltar o olhar, estava mais interessada no talão de cheques.
— Poderia ir até lá mais tarde para conhecer o lugar e oferecer meus serviços?
— Não sei, pergunte à minha irmã.
— Não estamos precisando de nenhum serviço, mas se quiser conhecer a fazenda pode ir até lá, não vamos dizer que futuramente não precisaremos deles.
— Muito bem, estarei lá a tarde...
Sem nenhuma sombra de dúvida Aléc era muito esperto, mas não seria o suficiente para me obrigar a continuar com tudo aquilo, ao menos era o que eu pensava naquela época.


Os anos sem dúvida me fizeram amadurecer, mas não o suficiente, ainda hoje eu teria feito muitas das coisas que fiz na época, principalmente ser um tormento para Aléc.
Sem atraso ele apareceu a tarde, frente aos empregados comportou-se como um perfeito veterinário, mas tarde eu descubriria que sua formação verdadeira era em medicina, mas nunca exerceu, a não ser quando era útil explorar cadáveres de ETs na ACO.
Quando finalmente nos vimos sozinhas com ele na sala da minha casa ele voltou a ser o mesmo Aléc de sempre:
— Estamos atrasados em nossas investigações, não podemos dormir no ponto.
— Aléc, talvez tu não tenha percebido, mas não está acontecendo nada de estranho aqui nessa cidade, nada de nada. Não ouvi ninguém falar sobre luzes no céu ou chupa cabras, isso está me parecendo um truque para distrair-nos. Paola falou convicta.
— Talvez não tenham ocorrido tais fenômenos hoje ou ontem, ou mesmo nesta última semana, mas os registros da ACO não estão errados, nunca estiveram! Aléc era além de tudo um cabeça dura.
— Mas Aléc, existe uma primeira vez para tudo na vida, mesmo para que a ACO erre. Vocês não são deuses, não podem ser sempre os senhores da verdade. Eu já não suportava os maus costumes da tal ACO em relação aos seus erros e acertos.
— Taemy, não tente outra vez me contrariar, o que temos aqui é um quadro típico de contatos com OVNIs, precisamos descobrir qual será o próximo ponto e estar lá.
— E se atrairmos a atenção da cidade para a fazenda? Paola sugeriu.
— Não, seria muito óbvil e não daria certo, temos que esperar. Aléc não aceitava idéias.


— Tenho notado que alguns de meus cães estão um tanto agitados durante a noite, ladram sem parar por volta da meia noite até umas três da manhã, então calam-se como se nada os irritasse. Eu não havia ligado isso ao caso, mas agora me parecia claro.
  É um sinal de que a criatura que buscamos está por perto, tente ao menos procurá-la... Aléc não parecia contentar-se nunca.
— Não estás querendo dizer para nós sairmos na rua com um ET a solta do lado de fora de nossa casa? Paola ainda não estava convencida de nossa missão.
— Estou mandando e não querendo... bem, tenho de ir, qualquer novidade me chamem na pousada, estarei lá...
Quando ele saiu eu quase di graças à Deus, não podia suportá-lo, estava quase que com ódio dele.
Mas as coisas não podia correr assim tão calmas, não foi meu gado que me fez crer na existência do chupa cabras, mas sim algo bem mais forte...
Numa bela noite de lua cheia em que meus cães ladravam sem parar resolvi deitar-me na rede da varanda, de lá podia ver parte do pátio da casa e até mesmo o velho paiol onde os cães rondavam algo invisível aos meus olhos. Estava distraida, cabeça em algum outro mundo que não era meu e nem dos tais invasores, mas de repente ouvi um ganido forte, sem dúvida era Hércules, meu cão negro feito a noite e de maior estimação.


Saltei da rede para o terreiro, engatilhei um revólver que trazia comigo e fui até onde meu pobre animal estava, encontrei-o deitado na porta do paiol, gemia, ouvi então algo correr, voltei meus olhos na direção em que ouvi o barulho e vi pela pouca claridade oferecida pela luz de minha varanda uma criatura correr, era baixa, cerca de noventa centímetros, parecia ter pêlos negros e talvez duas asas de morcego. Tomei Hércules nos braços e o levei até na varanda, pobre cão, estava com o pescoço cortado por marcas que pareciam dentes, mas estava vivo e seus olhos fiéis me observavam.
— Paola, ligue agora para Aléc, algo feriu Hércules e temo que ele morra...
Enquanto Aléc não vinha fiquei ali, acariciando meu fiel companheiro, percebia sua dor e aquilo me deixava triste. Como algo podia ferir um animal tão dócil como Hércules?
Quando Aléc chegou aplicou uma injeção em Hércules, seus ferimentos não seriam suficientes para matá-lo, mas eram suficientes para provar que a criatura estava rondando a fazenda.
— Tranquem bem as portas e janelas, coloquem os cães aqui perto da casa, eles vão dar sinal e defender vocês ao menos até que encontrem armas para atacar.
— O que atacou meu Hércules?
— Onde está Paola?
— Foi dormir, mas eu estou te fazendo uma pergunta Aléc...
— Taemy, tu sabes o que foi, vistes ele... por que ainda me perguntas?
— Aléc... eu não sei o que era aquilo, mas o que sei é que meu cão preferido foi quase morto de uma forma não humana...
— Seu cão é apenas um cão, a tendência é que isso passe a atacar humanos...
— Aléc, por favor, uma única vez na tua vida me ouve: vamos sair daqui e procurar algo que possa resolver isso sem que precisemos esperar por consequências piores...
— Taemy, não há outro orgão que trabalhe com isso, ou nós descobrimos essa criatura ou não sei...
   — E o que tenho que fazer?
   — Vá dormir, hoje ele não vai mais atacar...


— Porque tu me trata assim?
— Como?
— Me odeias tanto... não entendo porque estou aqui...
— Um dia tu vai saber porque eu te trato assim, existe perigo Taemy, perigo se eu não te tratar assim...
Não entendi as palavras dele, mas um dia entenderia, como ele mesmo me disse naquela noite... um dia...
No dia seguinte fui cedo até uma cachoeira que havia dentro da fazenda, queria pensar um pouco, pensar em tudo o que estava acontecendo na minha vida... mas não sei o que acontece comigo, é assim até hoje, continuará talvez sendo assim, por mais que eu queira estar calma, isolada das coisas que me rodeiam sempre acontece algo e eu acabo tendo que esquecer a paz...
Logo que cheguei a cachoeira deitei-me sobre uma pedra, podia observar o céu extremamente azul, era tão belo, não poderia acreditar que era justo dele que estava vindo a ameaça contra a qual eu teria de lutar, estava sozinha, Paola havia ido até a base buscar algumas coisas.
Meu olhar estava distraído, mas não o suficiente para deixar de ver aquilo... algo que passou rápido pelo céu, tinha uma forma alongada, parecia um cachimbo e sua velocidade era estonteante.
Não tive dúvidas, eu havia visto um disco voador, se bem que mais parecia um cachimbo voador.
Sem mais pensar resolvi fingir que nada havia acontecido, não porque quisesse fingir que não acreditava, mas porque não queria ter de chamar Aléc outra vez, a simples idéia de tê-lo por perto já bastava para me irritar profundamente.


 Quando a tarde chegou eu resolvi ir até a cocheira, queria ter certeza que nada havia afetado meus animais, afinal mesmo sendo tudo uma grande farsa eu não poderia deixar de cuidar deles, mesmo porque se fizesse o contrário iria levantar suspeitas, quando cheguei na cocheira encontrei um estranho junto com um dos peões, era um homem de uns trinta anos, forte, vestido como um peão de boiadeiro:
— Taemy, este rapaz veio procurar emprego aqui na estância....
— E quem é ele seu Chico?
— Não sou daqui não senhora, vim de longe, do interior também e estou precisando trabalhar.
— E o que sabe fazer?
— Seu Chico me disse que estão precisando de um domador de cavalos, eu domo qualquer animal minha senhora... qualquer animal...
— Qual seu nome?
— O pessoal me chama de Freire, meu nome de batismo é João Augusto Freire.
— Pois bem, eu lhe darei o emprego, mas não me chame mais de senhora, seu Chico irá lhe passar todas as ordens, é à ele que deverá obedecer e a nenhum outro empregado.
— Não irá se arrepender de ter me contratado !
— Espero que não, seu Chico, por favor, venha comigo até a baia do Valente, quero que o senhor sele ele para mim...
Valente era um cavalo negro, seu nome era o resumo de sua personalidade, quando chegamos na baia onde estava Valente eu recomecei a conversa com seu Chico:


— Quero que fique de olho neste tal de Freire, qualquer coisa de errado me avise imediatamente, qualquer comportamento que não seja normal ao seu ver.
— Porque o contratou se não confia nele?
— Precisamos de um domador...
— O que houve com Hércules?
— Meu cão foi atacado por algum animal na noite passada, mas está bem, o veterinário já o medicou.
— E que animal foi esse Taemy?
— Não sei não senhor! Mas vou descobrir, animal nenhum fere meu cão e escapa desta forma... suporto tudo, menos crueldade e foi isso que fizeram com meu Hércules.
— Já deve ter ouvido falar sobre o chupa cabras, dizem que ele anda atacando por aqui.
— Não sei se isso existe, mas mesmo que seja o tal chupa cabras... vai me pagar caro...
Seu Chico era uma espécie de capataz na fazenda, eu deixava tudo nas mãos dele e podia confiar, era idoso, a quatro donos que não saia da fazenda e sempre foi bem recomendado.
Saí para cavalgar pelos arredores da fazenda, queria conhecer alguns trechos que eu não conhecia, num determinado ponto tomei uma estrada abandonada, o mato já cobria parte dela deixando somente uma trilha para que passassemos, mas no final desta trilha encontrei algo que me surpreendeu: uma velha cabana, apeei e fui até ela, esperava encontrar muita sujeira, mas o que vi foi um lugar que nem de longe parecia estar abandonado: havia alguém morando na cabana e dentro de minha fazenda.


Eu havia aprendido a não ter medo de tudo e resolvi ficar ali, escondi-me no mato e deixei Valente amarrado ali perto, pastando, eu haveria de ver quem estava morando ali sem minha autorização, esperei por quase duas horas até que meu invasor chegou, vi quando entrou e fechou a porta, saí do mato onde estava e fui até a cabana, bati na porta e esperei que ele viesse abrir:
— Quem lhe deu ordem de morar aqui?
— Desculpe-me senhora, mas eu não tinha onde morar...
Meu estranho invasor não era nada mais do que Freire.
— Hoje foi até a cocheira me pedir emprego, mas já morava em minha terras.
— Eu vim para cá sem ter onde ficar, por isso acabei ficando nesta cabana, encontrei-a por acaso, caminhava por aí quando vi ela abandonada aqui no mato, resolvi vir para cá.
— Isso é invasão de propriedade Freire!
— Desculpe-me Taemy, mas não quero te decepcionar, juro que se me deixar continuar aqui tu nunca vai te arrepender... tu vai ver, eu ainda vou ser muito útil para ti.
Eu poderia ter mandado Freire embora naquele momento, mas não me convinha, mesmo porque passei a suspeitar do comportamento dele e para mim o lema sempre foi claro: antes o suspeito por perto do que longe dos olhos.
— Está bem Freire, vou te deixar ficar aqui e trabalhar para mim... a propósito, já ouviu falar nos ataques misteriosos à animais aqui na região?
— Sou tão forasteiro como tu és... mas ouvi sim, creio que um dia ainda vou capturar o tal chupa cabras.


Naquela noite recebi a inesperada visita de Aléc, chegou quando já eram umas sete horas, foi primeiro conversar com meu capataz e depois veio para a minha casa:
— Não sabia que virias hoje.
— Vim te avisar que a Paola não vai voltar essa semana e que o Hudson vai sair também, isso quer dizer que por uma semana seremos só nós dois.
— Eu vou ter de ficar sozinha aqui nessa fazenda?
— Vai. Teu capataz me falou que tu andou contratando um domador.
— Freire, é um sujeito estranho, estava escondido no mato aqui da fazenda, numa cabana abandonada.
— E tu o contrata?
— Sim, a propósito, eu vi um disco voador lá na cachoeira hoje cedo.
— E tu não me avisou nada? O que está acontecendo? Resolveu agir por conta própria?
— Mais ou menos...
— O que pretende fazer com esse tal de Freire?
— Mantê-lo bem na minha vista, pode ser suspeito.
— E o que te leva a crer nisso?
— Ele apareceu na minha fazenda junto com o chupa cabras, isso é o suficiente para mim.
— Tu andas muito auto suficiente para meu gosto, não esqueça que eu comando.
— Aléc, por tu ser filho do Alexander não podes mandar... és um agente também...


— Por eu ser filho do Alexander eu nunca tive privilégio, muito pelo contrário Taemy, eu acabei entrando nessa organização para ver se ao menos assim meu pai me via como filho e não como uma experiência! Aléc exautou-se, as palavras sairam rápidas.
— Experiência? Que experiência?
— Nenhuma Taemy, esqueça do que eu falei... boa noite.
Ele não explicou aquela frase, mas eu não a esqueci, era a segunda frase sem nexo que ele me dizia em menos de vinte e quatro horas, primeiro havia me dito que haveria perigo se não me tratasse mal e agora essa história de experiência, realmente eu não estava entendendo e muito menos imaginando o que poderia estar acontecendo além da própria organização.
Na manhã seguinte acordei meio estranha, minha vontade era continuar na cama pelo resto do dia e teria feito isso não fosse o telefone tocar logo cedo, do outro lado da linha a voz de Hudson:
— Taemy, nós precisamos fazer alguma coisa...
— Calma, tu nem me disse sobre o que!
— Alexander, ele me disse que não vai enviar a Paola de volta para a missão, parece que ele quer que ela fique como secretária dele.
— E ela?
— Está em pânico, não quer ficar de jeito nenhum mas o chefe não quer deixar ela decidir, parece que está muito mais interessado nela do que aparentava.
— Hudson, mas se isso for verdade é algo bastante grave, temos que saber se ela não quer realmente ficar, caso não queira temos que dar um jeito nessa situação.
— Talvez Aléc consiga convencer o pai dele a mudar de opinião.


— Mas Aléc é tão teimoso... não vai desobedecer o pai para não se ver mal na ACO.
— Então me diz o que faremos?
— Não vão poder me deixar sozinha aqui na fazenda...
— Além de tudo ainda tem isso, se a Paola não voltar para a fazenda tu vai ficar sozinha aí.
— Não mesmo, vou procurar o Aléc, desta vez ele vai me ouvir, não pode me trazer para cá e me deixar sozinha nas mãos de sei lá quem...
— Te apressa então, vou desligar, não quero que descubram que estou passando essa informação adiante.
Não liguei para Aléc conforme o combinado, fui até a pensão, primeiro porque tinha curiosidade de conhecer o lugar, depois porque não queria obedecer o Aléc.
Quando cheguei na pensão encontrei uma senhora muito simpática de nome Aurora, perguntei sobre o veterinário e ela me disse que ele havia saído, pedi então que ela dissesse pára ele que eu o havia procurado e precisava falar com ele urgente sobre meu cão.
Como desconfiei que Aléc demoraria um pouco a me procurar aproveitei o tempo para ir até a igreja, quando ia saindo de lá encontrei com uma garota, devia ter a minha idade e parecia muito triste, estava sentada na calçada da igreja, cabeça baixa, parecia ter chorado:
— Olá! Cumprimentei para puxar conversa.
— Oi...
— Posso ajudá-la?
— Não, ninguém pode...
— Desculpe, mas qual seu nome?


— Alice...
— Alice, eu sou Taemy, comprei recentemente uma fazenda aqui perto, não conheço ninguém por aqui, talvez tu possas me falar sobre o lugar.
— Olha, não há muito o que falar, mas se tu quiser eu soube de um baile que vai ter numa fazenda que deve ser quase vizinha da tua, podemos ir até lá.
— Ótimo! Quando será?
— Amanhã a noite...
— Então vamos fazer o seguinte Alice, eu passo por aqui para te pegar e vamos juntas... Pode ser?
— Pode...
— Mas tu ainda não me disse o que houve?
— É uma besteira, eu voltei para cá faz pouco tempo, mas não encontrei as coisas como eu queria encontrar...
— Como assim?
— Tudo mudou depois dessa história de chupa cabras, o pouco gado da nossa fazenda adoeceu e agora meu pai quer vender a fazenda e ir para a capital.
— Escuta, na minha fazenda algo atacou meu cão preferido a duas noites...
— Tem sido assim, seja lá o que for ataca só o melhor gado, os melhores cães, galinhas, enfim, só os melhores.
— Estranho, mas nada de diferente é visto quando o bicho ataca?
— Luzes no céu...
Luzes no céu... tudo continuava tão sem explicação quanto antes, mas era bom saber que logo eu ia ter contato, não com ETs, mas com o povo daquele lugar.


Eram umas três e meia da tarde, eu estava na raia observando Freire domar um dos cavalos, ele era um ótimo ginete, não demorou para sinalizar para que eu fosse até perto deles, aproximei-me e ele apeou:
— Vê patroa, Pégasus está manso como uma ovelha.
— Pégasus é um belo tordilho, vejo que seu trabalho é rápido, até ontem ninguém conseguia montá-lo.
— Pégasus não é arrisco, apenas não foi bem ensinado.
— Me responde uma coisa Freire: de onde tu vem?
— De longe, muito longe...
— Não sei como pude contratar alguém que nem diz o nome da cidade de onde veio... mas seu trabalho é bom, espero que não me decepcione.
 — Jamais, eu já disse patroa, eu ainda vou ser muito útil... veja, o tal veterinário vem chegando. Se mal o pergunte, o que tanto faz aqui? Porque seus animais são saudáveis como nunca vi, não sei o que ele faz por aqui...
— Política da boa vizinhança Freire, ele é tão forasteiro quanto nós...
Deixei Freire com Pégasus e fui até onde estava Aléc, convidei-o para visitar a cocheira, lá poderíamos conversar.
— O que aconteceu para me procurar na pousada?
— Soube que teu pai quer ficar com a Paola por lá, como secretária dele.
— Meu pai e suas idéias malucas! Vou falar com ele, vai ter de mandá-la de volta, não te quero sozinha nessa fazenda.
— Então concorda comigo?


— Pela primeira vez na minha vida, meu pai tem umas idéias meio equivocadas às vezes, deixar a tua amiga com ele é um risco para ela, espero que tu entendas o que eu estou falando...
— Ele costuma manter casos com as secretárias?
— Por vezes sim, mas não te preocupa, eu vou falar com ele e tenho um ótimo argumento para ele devolver a tua falsa irmã.
— E posso saber que argumento é esse?

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