sexta-feira, 29 de abril de 2011

— Taemy, teu caso é especial, sabe por que? Já que nenhuma das duas vai poder abrir a boca eu te digo: eu te trouxe para a ACO e agora tu não és subordinada do meu pai e sim minha. Eu tenho a tua família sob meus olhos, nem meu pai sabe onde eu os coloquei... isso te coloca nas minhas mãos. Tu não vai abrir a boca, mas se tu abrir eu fecho.


— Taemy!!! Corre, o gado da fazenda foi atacado!!! Freire invadiu a cozinha desesperado.
— O que houve Freire? Paola perguntou ao vê-lo naquele estado.
— Três cabeças de gado estão mortas no curral, parece que o sangue foi todo sugado.
— Aquele maldito animal!!! Aléc, se quer ir até o curral venha, senão tchau, vou ver o que houve. Não terminei de falar e saí com Freire e Paola, Aléc acabou nos seguindo.
Ao chegarmos no curral o gado estava lá, morto.
— Não sei o que pode ter sido Taemy, ninguém ouviu nada, ninguém viu nada, hoje cedo o rapaz que leva o gado para o pasto encontrou os três aqui.
— Freire, não diga nada à ninguém, chame o rapaz aqui e o pague, pague o quanto ela quiser para ficar calado e faço o mesmo com quem por ventura soube disso. Não quero que a cidade saiba que a fazenda está sendo atacada por essa criatura constantemente. Eu queria abafar o acontecimento, Freire pareceu entender perfeitamente e saiu em busca do empregado.
— O que tu quer abafando isso? Paola não estava entendendo a minha idéia.
— Se o chupa cabras for um extra terrestre irá voltar, não quero curiosos por aqui.
— Garotas, preparem-se para a surpresa: o monstro deixou uma pista... Aléc estava examinando o gado morto e ergueu-se bruscamente com algo na mão.
— O que é isso Aléc?
— Paola, a resposta é simples: pêlo... o nosso chupa cabras perdeu pêlo.


— Ótimo!!! Podes analisar isso? Minha curiosidade estava maior do que a deles.
— Invente uma viagem para teus empregados, a Paola vai ter de ficar cuidando da fazenda, mande o tal de Freire arrumar uns homens para vigiar a casa durante a noite.
— Porque isso? Eu não estava entendendo nada.
— Vamos para o laboratório de estudos, voltamos daqui a uns três dias, enquanto isso não deixe que a cidade saiba da tua viagem.
— Porque a Taemy tem de ir contigo? Não quero ficar sozinha aqui.
— Quero que ela me ajude nas análises, não quero que outras pessoas da ACO saibam disso... vou dar um jeito de mandar o Hudson ficar alerta, qualquer coisa ele me chama...
Sei que Paola não gostou nada daquilo, mesmo porque quando fui para casa com ela para preparar tudo para a viagem ela falou claramente:
— Não estou gostando nada desse tua viagem com o Aléc... ele não está pensando só na análise dos pêlos do chupa cabras e sim em algo além disso.
— Calma Paola, eu sei o que estou fazendo, não será a primeira vez que fico naquele laboratório sozinha com ele.
— Desde o começo isso me soa estranho, tu não me esconde algo sobre o Aléc. Esconde?
— Não... apenas que ele tem uma rivalidade com o pai e que isso vai ser nossa porta de saida da ACO. Não te preocupa comigo Paola, ele não vai me matar, tem outros planos e eu sei disso. Precisa de mim para vencer o pai dele.
  Espero que seja isso mesmo, mas cuidado!


Passei horas a fio no laboratório, Aléc remexia tubos e microscópios, por horas e horas, sem falar comigo uma palavra que fosse, até que num repente ele largou tudo:
— Taemy! Já sei o que é essa criatura...
— Sabe?
— Os pêlos são estranhos, mas posso saber que são de algo que mistura cão e homem...
— Isso é um lobisomem Aléc... não estás querendo me dizer que na minha fazenda existe um lobisomem?
— Estou querendo te dizer que isso não é um ET e sim uma criatura de laboratório... minha cara: alguém criou o chupa cabras.
— Se alguém criou o chupa cabras isso quer dizer que podem haver outros...
— Não sei, mas vamos ficar calados com isso, interessa-nos dizer que não conseguimos analisar esses pêlo, vamos esconder as amostras.
— Para que isso Aléc? Eu estava começando a ficar apreensiva.
— Talvez não seja exatamente um Extra Terrestre como nós esperavamos, mas isso não nos tira a possibilidade de ter sido gerado com tecnologia alienígena.
  Como tu fostes?
— Talvez, mas não nos interessa descobrir isso agora, já nos basta por enquanto saber que essa criatura não é humana e nem animal...
— Podemos voltar para a fazenda então?
— Não, vamos ficar mais um dia...
— Mas para que?


— Para que possamos esquecer um pouco de tudo isso... Aléc se aproximou de mim e novamente me beijou, mas naquele instante ouvimos quando a porta abriu-se e a voz forte nos assustou:
  Muito bem Alexander Mikaelovichk Filho! Outra vez inflingindo as leis da ACO!
— Pai?!!!
— Saia desta sala garota, preciso falar com o agente Aléc! Espere por nós no escritório.
— Vai Taemy, eu vou logo... Pela primeira vez eu ouvi Aléc falar comigo num tom de cumplicidade.
— Muito bem Aléc, desta vez eu vou te punir e punir essa garota que tu arrumou para a ACO.
— Punir a Taemy? Não, tu não vai punir a garota... e sabe por que meu caro pai?
— Porque eu não haveria de puni-la?
— Porque essa garota não é nenhuma das agentes que tu costuma usar. Não quero que tu chegue perto da Taemy, nem da amiga dela. Eu escolhi essa garota e ela é minha subordinada. Foi o que combinamos e a amiga dela é uma pobre coitada que só está nessa confusão toda porque eu não quis deixar a Taemy sozinha.
— Eu já cansei de te avisar que não quero envolvimento com agentes dessa organização, mas cada vez tu insiste em te envolver com uma nova. Mas dessa vez tu chegou ao ponto de catar uma mulher na rua e trazer para dentro da ACO. O que tem essa garota de importante?


— Não te faça de tolo meu pai, tu sabes muito bem que o rendimento dessa garota foi superior a qualquer outro no treinamento, em um mês ela atingiu o que os outros levam três meses para atingir.
— E o que isso te interessa tanto?
— Quero uma parceira, afinal os agentes nunca agem sozinhos e sim em grupos, mas tendo ela eu não precisaria de um grupo.
— Tu não sabes o que fazes... não quero envolvimentos, estou sendo claro Aléc?
— E quem é o senhor para me dizer isso? Por acaso não teve um caso com Elluanna?
— Cale-se! Antes que eu tenha de lhe punir por me desafiar!
— Me puna então! Punição maior do que ser teu filho eu não posso receber!
— Eu deveria ter te enviado para outro país! Longe de mim não ias me dar tanta decepção! Escute bem o que eu vou te avisar Aléc: se eu descobrir que tu continuas te envolvendo com essa garota eu vou punir os dois.
Alexander saiu da sala, não deve ter levado muito tempo para que Aléc aparecesse no escritório. Eu estava ansiosa, mal podia esperar para saber o que havia acontecido com os dois.
— Aléc, o que houve?
— Aquele velho desgraçado me chamou atenção por estar me envolvendo com uma agente outra vez e nos ameaçou de punição se descobrir que continuamos.
— E daí?
— Não sei... mas ele não pode me dizer nada, cafageste, me roubou a mulher que eu amava...


— Pelo jeito tu gostava mesmo desta tal de Elluanna.
— É, mas se ela estivesse viva hoje eu a mataria antes que ela pudesse morrer, teria o prazer de matá-la.
  E o amor que tu diz sentir?
— Acabou, nunca mais serei capaz de amar Taemy, nunca... E tu, já amou alguém de verdade? Sabe o que eu estou falando?
— Se quando tu me raptou tivesse me investigado de verdade saberia que sim...
— Então deixaste alguém?
— Não, ele não me amava, perdi muito tempo de minha vida amando sem ser amada...
— O que te faz pensar que foi tempo perdido?
— Quando a gente ama sem ser amado é muito triste, sabe... às vezes eu penso que nunca mais vou amar. Mas o que fazer?
— Taemy, se a vida não fosse tão dura com a gente talvez fossemos pessoas de bem, mas não é possível...
— Além de Elluanna tu nunca teve outra decepção?
— Não... nunca tive relacionamentos sérios, só esse. Mas hoje, mesmo que por  um dia eu tenha alguém Taemy, mesmo que seja por um dia... eu não vou suportar traição.
Ele aproximou-se de mim e me fez levantar da cadeira onde eu estava sentada, e me segurou pelos braços:
— Olha nos meus olhos quando eu falar contigo Taemy...
— Não vejo nada além de mentiras atrás deles...


— Que isso sirva para ti garota: nunca pense em me trair, enquanto tu estiveres na ACO eu te quero para mim e isso tu deves entender bem.
Eu não havia ouvido nada assim dele, aquela frase me deixou em reação alguma, eu não sabia o que fazer ou dizer.
— Fale alguma coisa Taemy! Não te faça de muda!
— Um dia tu me disse que isso seria impossível mesmo se tivéssemos que fingir numa missão, por que agora tu me diz isso? Porque agora que a gente estava começando a parar com nossas intrigas?
— Porque nós dois estamos sozinhos nisso tudo e tu sabe bem, somos fadados a viver sozinhos minha cara... e por isso nos merecemos.
Por uma parte ele tinha razão, tanto ele como eu estavamos agindo contra a ACO, não éramos nada além de traidores.
No dia seguinte voltamos para a nossa pequena cidadezinha, Paola como sempre me cercou com perguntas, mas não obteve grandes respostas, não naquela manhã.
A tarde parecia que minha amiga estava desistindo de questionar sobre a análise, mas resolveu fazer uma última tentativa:
— Não conseguimos nada Paola, nada além de levar uma chamada de atenção do chefe.
— Alexander esteve no laboratório?
— Chegou de surpresa e acabou encontrando eu e o Aléc nos beijando... Está satisfeita agora?
— Não! E então o que ele fez?
— Me mandou sair da sala e chamou a atenção do Aléc, ameaçou de nos punir se continuarmos nos envolvendo: é proibido isso na ACO...


— E vocês continuam?
— Paola, eu sempre confiei em ti, espero que ainda possa confiar...
— Claro que sim!
— Eu acredito que desta vez eu me meti numa confusão maior do que eu posso solucionar, Aléc me disse que se eu me arriscar a trair ele, ele acaba comigo. Paola, eu juro que não era exatamente isso que eu queria, mas não posso fazer nada.
— Então estão tendo algo?
— Sim...
Eu não podia negar nada para Paola, ela lia meus pensamentos, mas não lhe contei do que havia acontecido no escritório do laboratório na noite anterior, mesmo porque se eu lhe falasse que havia feito amor com aquele homem ela iria me condenar e não era isso, eu não estava agindo sem pensar, mas não podia me livrar de Aléc, ele era perigoso.
Eu, eu que tinha minha vida tranqüila e reclamava, agora estava presa numa organização que tinha quase certeza ser ilegal, estava com minha família nem fazia idéia de onde e agora além de fazer parte dos planos de um traidor era amante deste e para piorar mais ainda isso podia me custar a vida.
Minha vida estava chegando à um ponto em que eu acreditava que nada mais podia acontecer, ao menos nada que não tivesse uma explicação lógica. Mas eu haveria de me enganar mais umas vezes antes de aprender a não desacreditar no impossível.
A noite anunciava uma tempestade terrível, raios e trovões cortavam o ar de uma modo assustador.
Não sei porque, mas naquele dia senti um medo estranho se apoderar de mim, um medo que eu nunca havia sentido, insisti com Paola para que trancassemos a casa cedo, antes da escuridão da noite se atirar sobre nós, felizmente ela concordou.


Freire apareceu em nossa casa assim que tinhamos acabado de trancar tudo, estava estranho, parecia querer falar alguma coisa, mas nadava de um lado para o outro sem dizer uma palavra que fosse.
Mal a noite chegou a chuva caiu torrencialmente, estavamos na sala, nós três:
— Paola, eu vou para o meu quarto, creio que seja melhor o Freire dormir aqui hoje.
— Está bem Taemy, boa noite então!
Eu sabia que minha amiga estava muito interessada em Freire, acreditei ser a ocasião perfeita para que os dois ficassem sozinhos e para que eu meditasse sobre o que estava acontecendo comigo.
Era aproximadamente meia noite quando ouvi um barulho forte vindo da cocheira, não esperei para chamar os outros, peguei minha arma e fui até lá.
Maldita hora aquela, quando entrei na cocheira vi que o barulho vinha da baia de Pégasus, corri até lá e a cena que vi foi no mínimo nojenta: uma criatura de corpo coberto de pêlo, media uns noventa centímetros na posição em que estava, era um misto de cão e homem, digo, tinha pêlos de cão, apoiava-se sobre os pés, corpo arcado, a sua cara era humanóide, estava com os dentes cravados no pescoço de Pégasus, este relinchava e debatia-se, parecia desesperado:
— Largue o meu cavalo maldito chupa cabras!!!
A criatura voltou o olhar para mim, seus olhos eram vermelhos, largou Pégasus e ficou ali, me olhando.
— Não sei que animal tu és, mas vou te matar seu desgraçado! Vou te matar por seu Chico e pelos meus animais...


Aquele monstro enveredou contra mim, saquei a arma e instintivamente apertei o gatilho, é a última coisa que me recordo...
Acordei dois dias depois no meu quarto, estava com uma dor forte na cabeça e mal consegui abrir os olhos. Aléc estava ali, ao lado da minha cama e sorriu quando me viu acordar:
— Aléc, o que aconteceu comigo?
— Vou chamar a tua amiga, ela te conta tudo, agora preciso sair, tenho que resolver algo.
Assim que Aléc saiu do meu quarto Paola entrou:
— Paola, me conte o que houve, por favor... minha cabeça dói muito...
— Taemy, naquela noite tu foi até a cocheira...
Eu havia atirado no monstro, Pégasus provavélmente tenha se agitado, Paola me disse que me encontraram caída dentro da baia, havia uma marca roxa na minha testa e eu estava completamente inconsciente.
Naquela hora ela apenas lembrou de pedir para que Freire fosse procurar Pégasus e disse que ela iria chamar um médico urgente, mas chamou Aléc. Houve um intervalo pequeno até que ele chegasse e Freire o encontrasse na baia com Paola e comigo desacordada, Aléc segurava minha cabeça, ajoelhado:
— Porque não chamou um médico Paola? Por que chamou esse homem?
— Aléc é formado em medicina Freire, pode nos ajudar...
— Se os dois estivessem fazendo o que lhes era de responsabilidade ela não estaria aqui. Paola, como ela veio parar aqui?
— Não sei, eu não a vi sair de casa...
— Imagino que estavam muito ocupados...


— Aléc, assim que ouvimos o disparo corremos para ver o que era e encontramos ela caída. Freire explicou.
— Ela está em coma, provavélmente alguma coisa bateu na cabeça dela.
— O que podemos fazer por ela?
— Nada Paola!!! Nada e isso me desespera.
— Eu posso fazer algo, mas para isso preciso que não falem nada e que tudo o que verem por aqui seja mantido no mais absoluto segredo mesmo que as coisas digam o contrário.
— E o que tu podes fazer Freire? Paola não havia entendido e nem Aléc.
— Vejam... Nesse momento ele ergueu as mãos e luzes saíram delas direto para a minha cabeça.
— O que significa isso? Aléc parecia apreensivo.
— Leve ela para casa Aléc, e mais uma coisa, não me perguntem o que é isso ou o que eu fiz, daqui a dois dias ela irá acordar sem nenhuma sequela.
Paola terminou a narrativa:
— E foi isso Taemy, nunca vi Aléc tão desesperado na minha vida como estava naquela noite, ele nos acusou de ter te deixado sozinha, eu creio que deixou transparecer mais do que deveria sobre o que há entre vocês.
— Não há nada entre nós Paola.... a gente apenas acabou ficando junto em alguns momentos em que o desespero por tudo o que vivemos foi maior do que deveria.
— Taemy, eu sou tua amiga, a gente nunca teve segredos e não é agora que deveremos ter, é impossível não perceber que entre tu e o Aléc existe algo além da profissão e além de um simples caso.


— Não, o Aléc só teve olhos para a Elluanna e a traição dela matou tudo o que ele poderia sentir por uma mulher, além disso tu sabes muito bem que eu amo outro.
— Outro que não te ama Taemy! Além do mais eu não acho que tu o ames ainda, nem ao menos falaste nele nos últimos dois meses.
— É... acho que estou esquecendo ele.
— É tempo, por causa desse homem tu te trancou dentro de si mesma e não teve mais olhos para ninguém, se há uma vantagem nessa história toda é esse teu envolvimento com o Aléc, mesmo que não haja sentimento envolvido... ao menos tu estás esquecendo aquele idiota.
— Paola, eu não quero pensar nisso agora, quero encontrar um meio de sairmos disso e só.
Eu não sabia, mas Aléc havia ido atrás de Freire na cabana:
— Eu vim até aqui saber o que tu és Freire...
— Eu pensei que havíamos combinado de não haver perguntas!
— Não é uma pergunta! É uma curiosidade, não vai sair daqui.
— Aléc, eu sei quem tu és e quem são as garotas, não precisa fingir...
— Como tu sabes e o que tu sabes?
— Conheço a ACO a muito tempo, desde o tempo em que mataram a minha mãe...
— E por que veio para esta fazenda justamente com duas agentes da ACO?
— Eu quero mais do que tudo na minha vida acabar com essa maldita organização meu caro, mas sei que as garotas não são mais do que vítimas tuas e de teu pai.
— Isso não explica o que significa o que houve na cocheira!


— Não, mas para quem nos caçou durante toda a vida tu deverias saber quem eu sou Aléc.
— Um alienígena? E quem foi tua mãe então?
— Meu povo vive da ciência a muitos anos Aléc, minha mãe foi uma cobaia para o teu querido pai, ele a usou para gerar algumas criaturas de laboratório através de nossa tecnologia de inseminação artificial, clonagem e cruzamento de gens.
— Tua mãe foi morta por isso?
 — Por ser um perigo para a ACO, ela era como eu, uma espécie alienígena com toda a carga genética igual a de vocês terráqueos, mas ele temia que ela falasse. Creio que não sabia de minha existência, eu era só um garotinho ainda.
— Se tu conhece bem meu pai deve saber que eu não sou tão filho dele assim, e nem sou um dos maiores defensores da ACO, por isso eu te peço para continuar aqui e deixar tudo como está, brevemente eu vou mudar a história desta organização. Por enquanto creio que tua presença será benéfica para as garotas.
— Tenho notado que Taemy é muito importante para ti, espero que não faça com ela o que teu pai fez com minha mãe.
— Aquele homem não é meu pai Freire, se é que estamos falando com sinceridade... eu não passo de uma experiência para ele.
— Então me ajude a prender essa criatura, esse monstro foi gerado nos laboratórios da ACO com tecnologia de meu planeta.
— Farei isso...
Aléc saiu da cabana com uma resposta e muitas questões: se a mãe de Freire havia sido morta por Alexander as histórias do dois eram extremamente semelhantes.


— Paola, faz um grande favor para mim, vai até a pousada e procura o Hudson, diga para ele que eu preciso urgente de um arquivo da ACO, que ele deverá vir para a fazenda contigo, leve meu carro.
— Mas Aléc, está tarde... logo vai anoitecer.
— Vá antes que escureça, na volta estará segura pois Hudson virá contigo.
— E a Taemy?
— Deixe ela comigo, cuido dela.
— É... eu sei!
Eu entrei na sala e ouvi apenas o carro arrancando:
— Aléc, onde vai a Paola?
— Buscar Hudson, tenho que pedir algo para ele... a sala de computação está em ordem?
— Sim, está... mas por que?
— Lembra Taemy do que eu te falei sobre a minha mãe?
— Lembro, mas o que tem isso com a sala de computação?
— Nada... esquece!
— Pensei que os segredos sobre esse assunto não existissem mais entre nós dois...
— Entre nós dois Taemy existe muita coisa, mas isso não é só minha vida, mas a de outra pessoa.
— Não confias em mim Aléc?
— Está bem, eu fui procurar o Freire, ele me contou uma história sobre a vida dele.
— E o que ele disse nessa história?


— Freire é um alienígena Taemy! Mas o pior é que ele me disse que meu pai matou a mãe dele por causa de umas experiências genéticas e o que aconteceu com minha mãe foi exatamente o mesmo.
— Isso quer dizer que a mãe de Freire e a tua podem ser a mesma mulher?
— Taemy, isso quer dizer que eu venho caçando ETs a tantos anos e na verdade eu posso ser...
— Ser um deles? Isso seria impossível Aléc.
— Queria que fosse, mas não é, não agora que ouvi isso. Por anos eu suspeitei que meu pai escondia algo além da história do bebê de proveta e isso parece ser o que ele escondia. Por isso Taemy, por isso ele deve ter me odiado tanto, afinal eu sou uma das caças dele.
— Tu me disse que o chupa cabras é um animal de laboratório, pode ser então que ele seja resultado da mesma experiência que tu?
— Pode...
Naquele instante eu não encontrei uma palavra certa para dizer o que eu queria, mas Aléc percebeu minha mudança, meu silêncio fez com que ele pensasse algo, mas não o certo:
— Ficaste com medo de mim agora Taemy? Agora que sabes o que eu posso ser?
— Não...
— Durante esses dois meses não ficaste calada para mim nenhuma vez e agora te calas. O que foi? Vai fugir de mim?
— Não tenho porque fugir Aléc, o que havia de ser entre nós já foi. O que mais pode me acontecer?


— Não sei Taemy, mas de agora em diante eu vou fazer de tudo para acabar com o meu pai, irei matá-lo assim que tive uma oportunidade. Estou cansado das desgraças que ele vem ocasionando e não quero ser mais um dos agentes responsáveis por isso.
  Não Aléc! Apesar de tudo ele é teu pai, não podes matá-lo. Destruí-lo como chefe da ACO é uma coisa, mas matar é outra. Se algum dia tu deu algum valor para mim ou para o que eu te digo, por favor não faça isso.
— Eu não posso garota! Não posso deixar esse homem solto por aí.
— Aléc, tu sempre soube do covarde que ele era, das maldades que cometia em nome da ACO, mas nunca fez nada. Não é agora simplesmente por causa de uma amante que tu irás matá-lo, porque tudo o que tu estás fazendo é por causa de Elluanna, mas tu mesmo não a deixou me falar sobre coisas que sabia. O que ela teria me dito Aléc?
  A morte de Elluanna não me impressionou em nada Taemy! Já te disse que a mataria se ainda vivesse...
— Mas ela queria me dizer algo. O que era?
— Fico impressionado com a tua capacidade de desviar de assunto garota! Não fale besteiras! Tu ainda és uma agente e deve respeito e obediência à mim, por tanto cale-se quanto ao assunto Elluanna!
— Calar? Não, não vou me calar e muito menos para ti, estamos sozinhos aqui Aléc e eu vou te falar o que ela iria ter me dito: que tu sabia o tempo todo que eras não um filho de proveta de Alexander, mas uma experiência como tu mesmo me disse, tu sempre soube que havia algo além da proveta, mas não disse nada. Isso eu não entendo...


— Não, eu não sabia disso, não era isso que Elluanna iria te dizer, não era isso que eu temia que ela te dissesse, mas que te falasse do nosso caso. Elluanna era uma agente muito ligada ao recrutamento, sabia que tu serias minha parceira, por isso apareceu no laboratório aquele dia, ela desconfiava de tudo o que iria acontecer e talvez temesse que tu tivesse o mesmo destino que ela.
— Mas meu destino é ainda pior Aléc, pior porque ela morreu por ter tido um caso com teu pai, ter traído pai e filho com outro homem e eu? Porque razão irão me matar quando eu não for mais útil para vocês? É isso, vocês dão sumisso nos agentes que não servem mais aos propósitos de vocês?
— Não posso negar que sim, os agentes nunca podem sair da ACO, não podem falar sobre o que veêm aqui e se sairem poderão falar. Entendeu Taemy?
  Entendi, a ACO é um acordo de fidelidade, não há como sair e não se escolhe entrar...
— Isso! Mas não te preocupa, não pretendo te deixar sair.
— Irás me matar quando eu não for mais útil para teus propósitos na ACO?
— Não! A não ser que tu me traia, mas isso só iremos saber na hora exata.
Conversamos por um longo tempo, até que Hudson chegou acompanhado de Paola, então Aléc e Hudson trancaram-se na sala dos computadores e não nos deram permissão para ficar lá.
Tranquei-me no meu quarto, sabia exatamente como agir. Tinha escondido um  computador portátil e podia ligá-lo à rede e descobrir exatamente o que eles estavam pesquisando. Paola acabou entrando no meu quarto e descobrindo o que eu fazia:
— Taemy, quem te ensinou isso?
— ACO... eles me treinaram não foi? Esqueceram de me proibir de ler certas coisas.
— E o que o Aléc e o Hudson estão pesquisando?


  Não posso te dizer agora, mas vai ser uma bomba relógio em minhas mãos se eu conseguir descobrir o que é.
— Prefiro ir para meu quarto e ficar bem longe de toda essa confusão.
Era bom que ela ficasse longe, eu sabia perfeitamente que uma coisa seria eu ser apanhada por Aléc espionando e outra bem diferente seria Paola.
Mas o que eu descobri iria revelar algo que eu até então apenas suspeitava: Aléc era filho da mesma mulher que Freire havia se referido como sendo sua mãe.
Aléc e Freire eram irmãos, isso provava definitivamente que Aléc não era nada mais do que o que ele sempre caçou: o caçador havia virado caça bem diante dos meus olhos.
A trama estava cada vez mais se complicando e eu estava cada vez mais ciente de que a minha presença nesta trama haveria de ser ainda mais marcada.
Parecia uma maldição, tudo o que eu me envolvia tomava um rumo não previsto e seria o mesmo com a ACO, não havia mais como negar que Aléc iria tentar algo contra Alexander e que Alexander não estaria nem um pouco preocupado em matar Aléc, pois este na verdade era somente uma experiência para ele e não um filho.
Mas uma coisa ainda me intrigava: se Alexander sabia que Aléc não era de todo um terráqueo então o que ele pretendia mantendo um alienígena na ACO? Havia ainda algo oculto sobre a finalidade de Aléc ter sido gerado nos laboratórios da ACO, uma finalidade que eu queria descobrir e iria descobrir antes do que eu imaginava.
Percebi quando os dois desconectaram o computador, tratei de desligar o meu e escondê-lo novamente.
Voltei para a sala e esperei que Aléc falasse algo, mas ele simplesmente saiu, Hudson permaneceu imóvel por alguns segundos, tempo para que eu o interrogasse:


— O que descobriram?
— Aléc não quer que eu fale Taemy, e desta vez é justo que eu não o faça. Mas ele está arrasado, o que ele soube agora é algo que muda tudo o que até então acreditava.
— Quando voltam aqui?
— Não sei... mas não deixe que Freire saia da fazenda, precisamos dele por aqui.
— Hudson... o que vai acontecer com a gente agora?
— Não sei Taemy... mas temo pelo pior!
Vi Hudson virar as costas e sair, estava sério como eu nunca o havia visto.
As vezes eu penso que quem disse a frase: desgraça pouca é bobagem me conhecia, porque sempre que algo de errado me acontecia ou acontece vem acompanhado de mais algo.
Um dia uma amiga me disse que nada é tão ruim que não possa piorar, isso sim é uma verdade.
Assim que o dia amanheceu ouvi um carro freiar em frente a porta da minha casa, não esperava ninguém, acabei pedindo que Paola fosse até lá ver do que se tratava e que tomasse alguma providência se não fosse nada de importante, afinal ela era mestra em desculpas esfarrapadas, mas não levou muito tempo para que Paola voltasse para a cozinha onde estava e me dissesse o que menos eu esperava naquela manhã:
— Taemy, Alexander está lá na sala e parece estar zangado.
— O que ele faz aqui?
— Não sei, mas para vir até aqui não deve ser boa coisa.
— Vamos lá então...
— Não Taemy, ele quer falar é contigo e não me adiantou do que se trata.


— Está bem, seja lá o que Deus quiser!!!
Quando cheguei na sala encontrei Alexander sentado no sofá e com uma cara de poucos amigos.
 — O que aconteceu?
 — Taemy, ontem alguém acessou o computador central do laboratório de estudos e vasculhou alguns arquivos antigos.
 — Como sabe?
 — Sistema de segurança, rastreamos e descobrimos que o acesso veio daqui, da tua sala de computação.
 — Mas eu não sei do que se trata...
 — Aléc, isso é serviço dele, mas tu deves estar sabendo o que ele procurava.
 — Não...
 — Escuta uma coisa: tu não deves obedecer ele, o teu chefe sou eu.
    Disso eu sei senhor...
 — A não ser que queiras morrer junto com ele.
 — Mas ele é seu filho!
 — Não! Aléc não é meu filho, é filho de uma alienígena e de um agente da ACO, só o registrei com meu filho e o criei como tal para não perder a minha melhor experiência genética. Nunca ninguém soube disso Taemy!
 — Isso é cruel demais com ele!
 — Não te envolve com ele garota! Ele não é humano, é um agente genéticamente modificado, Aléc não é humano...


 Eu não sabia com reagir diante de tudo aquilo, não queria que Alexander soubesse de tudo o que Aléc já havia me dito e nem que soubesse do que eles queriam no computador central, por isso resolvi fazer o que um dia Aléc havia me dito que eu fazia bem: representar.
 — Mas Alexander, se isso é verdade então por que me colocou numa missão com esse ET?
 — Porque queria testar até onde tu podias ir, Taemy, se eu souber que tu tens traído a ACO e estás fazendo o jogo do meu querido filhinho eu não vou ter dó e nem piedade de ti. A tua família ele escondeu, não sei onde, mas encontro, encontro se for preciso e os mato!
 — Não vai ser preciso Alexander, não estou fazendo o jogo do Aléc, mas não te preocupa que o que ele queria ontem no computador não era nada relacionado ao que tu me contou, não foi ele quem acessou o computador e sim eu, eu o acessei para descobrir algo sobre o chupa cabras, queria ver se haviam registros antigos de monstros daquela espécie.
 — Espero que não estejas mentindo, porque eu já te disse: não aceito traições na ACO... Elluanna foi um caso.
 — Elluanna... o que tinha ela de especial afinal das contas. Sim, porque para o senhor e o Aléc falarem tanto nela não pode ser por pouca coisa...
 — Elluanna era uma agente acima da média, costumava resolver os casos antes do que os outros, estava sempre a frente de tudo, mas acabou envolvendo-se com Aléc, mas eu também tive um caso com ela.
 — Isso eu sei...


 — Elluanna não se contentou em ter sido minha amante e ter enganado o Aléc, traiu-me com outro agente: Samuel e isso me obrigou a matar.
 Eu já havia ouvido o Aléc me repetir umas cem vezes que havia sido Alexander o assassino de Elluanna, mas ouvi-lo agora era muito pior, além disso eu precisava manter o sangue frio o suficiente para não deixar transparecer nada do que eu sabia para Alexander.
 — Eu espero sinceramente Taemy que não tenha de perder uma boa agente por culpa de um simples romance, tu és muito inteligente, faria uma grande falta para a ACO, mas se continuares seguindo as idéias absurdas do Aléc não irás muito longe.
 — Não te preocupa Alexander, eu não estou indo atrás das idéias do Aléc, tenho sempre as minhas idéias.
 — Além do que eu acredito que tu não és capaz de te envolver com um homem que te trata como ele vem te tratando. As vezes que eu os encontrei juntos ele te usava como um trofel, exibindo aquela cicatriz.
 — Eu sei...
 Quando Alexander saiu de minha sala eu senti um grande alívio, sabia que precisaríamos caçar o chupa cabras o mais rápido possível, pois caso contrário estaríamos dando tempo para o azar nos pegar, Alexander estava ligado nos nossos movimentos, um passo em falso que fosse e estariamos perdidos. Não só Aléc ou eu, mas todos nós.
 Eu precisava saber se Alexander havia procurado por Aléc, fui até a pousada e encontrei como sempre Aurora:
 — Bom dia dona Aurora!!! O Aléc está?
 — Não, ele disse que se alguém o procurasse estaria na cachoeira das Três Quedas.


 — E onde fica esse lugar?
 — Fica a uns três quilometros acima da tua fazenda minha filha, é o lugar onde os três rios do município se unem e formam o rio principal.
 — Obrigada!!!

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