sexta-feira, 29 de abril de 2011

O PODER



Eu era uma dessas garotas comuns, contava com meus vinte e quatro anos e não tinha lá grandes ambições. Sonhava com coisas que não podiam ser tão difíceis de atingir.
Na verdade eu era infeliz, não posso negar, tinha uma vida normal, mas me faltava algo... um dia eu ia querer continuar com essa falta e não ter vivido o que vivi.
Talvez o algo que me faltasse estava no amor que eu sentia por alguém mas que não era correspondido, mas eu não podia fazer nada, afinal amar e não ser amado é tão comum nos dias de hoje.
Mas aquilo não me tornava alguém amarga, me entristecia, mas nada além disso.
Ainda lembro quando tudo começou, não queria, sinceramente eu não queria lembrar, mas as coisas que são semeadas em nossa memória são difíceis de apagar.
Eu não tinha motivos para desejar a vida que acabei tendo. Eu tinha desejos, isso não posso negar, mas eram desejos de ter uma vida normal, de ser feliz... ah, como eu vivi intensamente depois de tudo!
Na verdade as coisas começam sem que a gente tenha muita chance de saber o porque ou como começou, mas eu me lembro bem, muito melhor do que deveria.


Lembro que era um mês de janeiro, eu estava de férias, finalmente eu estava de férias, eu sei que naquele dia eu havia decidido caminhar um pouco, tinha muitas coisas para pensar e não queria ficar dentro de casa, não suportava a idéia de estar dentro de casa. No meio do caminho que eu havia decidido tomar um carro freiou bruscamente, um carro que mudaria toda a minha história de vida e talvez de morte.
Eu não me recordo de muita coisa, mas lembro que daquele carro sairam dois homens empunhando revólveres e me fizeram embarcar.
Parecia um grande pesadelo, não tinha como sair daquele carro e nem podia olhar para frente, aqueles homens haviam me ameaçado e eu teria de ficar calada até que chegassemos no local combinado.
Lembro de quando desembarquei daquele carro, estava tremula, não tinha nem coragem de olhar para os lados, mas aqueles dois homens me seguraram, cada um por um braço e me fizeram entrar numa casa, aparentemente parecia uma casa comum de fazenda, mas isso seria uma triste ilusão, não era comum, nada ali era comum, lembro que quando entrei lá fui conduzida até uma sala escura, eu fiquei extremamente apavorada, queria fugir, mas nem coragem de tentar eu tinha.
Fui convidada a sentar numa cadeira onde logo me deixaram sozinha, foram segundos, mas pareceram minutos, então naquela sala entrou um outro homem, era um senhor de uns cinquenta e tantos anos, terno preto, rosto fechado, extremamente sério, quando me viu pareceu examinar-me como se examina uma mercadoria, sentou-se depois do outro lado da mesa que havia frente a cadeira onde eu estava:
— Taemy, tenho algumas notícias para te dar...
Como este homem sabe meu nome? Pensei.
— O que o senhor quer? A pergunta veio como que automática.
— Quero que tu me faço um grande favor, me obedeça, não quero ter que perder uma grande ajuda sem ao menos tê-la.


Aquela frase me fez ter a certeza de que as coisas ali eram bem mais barra pesada do que eu imaginava.
— Taemy, neste exato momento tua família está sendo transferida da tua cidade para um outro canto do país, temos todos em nossas mãos, eles não sofrerão nada, serão sustentados por nós, mas isso depende de ti.
— E o que terei de fazer? Eu não estava raciocinando muito bem.
— Eu creio que tu serás muito útil para nós, deixe eu te explicar as coisas por partes, antes de mais nada eu te enviarei para um treinamento passarás por alguns testes e serás enviada à um de nossos laboratórios para que te especialize em informática e aprenda algumas  coisas básicas para o serviço.
— Serviço? Que serviço?
— Fique calma e calada, quando for a hora de saber o que deverá fazer tu saberás, agora apenas me obedeça, um dos meus homens irá te acompanhar até o laboratório e te fará companhia por um mês, ele será teu apoio, pergunte à ele o que precisar e na medida do permitido ele te responderá.
O permitido para mim estava claro: nada!
Eu fui para o tal laboratório, não havia outro meio, eu estava com as mãos e pés atados, minha família havia caído nas mãos deles e eu nem sabia quem eram eles.
Um mês, um mês presa num laboratório de treinamento com um homem que mais parecia uma tábua, calado, vestido de preto e nem sequer sei se tinha dentes, pois nunca o vi sorrir. Aprendi a dirigir, nadar, atirar e me especializei em informática, em trinta dias, eu havia passado por um treinamento intensivo de dezesseis horas por dia, treino pesado, duro, mas eu aprendi, aprendi como deveria e como não deveria, me tornei uma enlouquecida aprendiz, compulsiva até.


Quando o mês se encerrou eu acabei sendo levada novamente a presença do tal senhor de cinquenta anos, sentei na mesma cadeira e esperei por uma fala:
— Muito bem Taemy, tenho aqui os relatórios de teu rendimento, foi superior ao esperado, quero dizer, ao que esperava de outros, afinal tu tens uma capacidade muito grande de apreender.
— Não quero elogios, quero saber o que estou fazendo aqui e onde está minha família?
— Tua família está bem, quanto ao teu cargo, bem, creio que seja hora de saberes o que é isso aqui...
— Creio que já tenha passado da hora!
— Eu sou Alexander Mikaelovichk, sou o principal chefe desta organização.
— Não me interessa teu cargo nisto, quero saber o que é isso e o que eu estou fazendo aqui!!!
— Existem coisas estranhas acontecendo aqui garota, mas não cabe à polícia investigar este tipo de coisa, mas cabe à nós...
— E que coisas são estas e quem somos nós?
— Eu preciso de alguém que passe por uma garota completamente acima de suspeitas, que seja inteligente e audaz, talvez tu seja esta pessoa.
— E o que quer de mim?
— Já ouviu falar de extra terrestres?
— O que?!!!
— O que acontece aqui entre estas paredes é confidencial garota, por isso tua família foi levada para longe de ti, por isso tu tens que ficar bem calada e apenas me obedecer.


— Eu não acredito nessas coisas, nem ao menos sei o que posso fazer em relação à elas, por favor, fale!
— Taemy, eu sei que tudo pode parecer extremamente complexo, muitas pessoas negam a existência deles, mas eles estão aí, espalhados por todos os cantos, vivendo entre nós como pessoas normais.
— Eu só vou acreditar vendo! Eu não era muito crente, duvidava de tudo que não pudesse ver.
— Está bem Taemy, tu irás ver, estou esperando por alguém e ele te levará até um dos nossos laboratórios de estudos, lá tu irás ter todas as provas que precisas.
— Provas? E quanto ao que estou fazendo aqui?
— Somos uma organização bastante forte, poucos agentes e muito trabalho, mas podemos nos orgulhar de realizações, nem uma nem duas, mas muitas.
— E o que fazem estes agentes?
— Caçam ETs...
— Caçar? Mas eles não são animais, quer dizer, se é que existem!
— Tu não podes mais duvidar e muito menos voltar atrás, tua missão neste lugar será muito simples, irás com um dos agentes para uma cidade do interior onde estão ocorrendo alguns casos estranhos, casos que não estão encontrando uma explicação lógica.
— E quem é esse agente que irá comigo?
— Na verdade ele é meu filho: Aléc.
— Seu filho é um dos agentes?
— Não sei o que te espanta nisto Taemy, Aléc é um ótimo profissional e além disso não me deu um terço do trabalho que tu e os outros dão.
— Claro, deve ter sido criado aqui!


— Foi, criado nestes corredores, convivendo com os mais espantosos achados em matéria de seres de outros planetas.
— Deve ser um destes cientistasinhos metidos a besta que não sabem o que querem da vida.
— Pergunte isso à ele, afinal ele está aí na porta!
Quando me voltei o meu susto só não foi maior porque as coisas já não me assutavam com tanta facilidade.
— Eu estava esperando por você meu filho, esta é Taemy, a nossa nova integrante, quero que a leve até o laboratório de estudos para que apresente à ela os nossos mais preciosos achados.
— Aqueles corpos dilacerados, bem, não creio que seja um bom programa, mas vamos até lá então.
Corpos dilacerados foi uma expressão que me deixou horrorizada, tão horrorizada que fiquei por alguns segundos paralizada, só me movi porque Aléc aproximou-se de mim e disse em tom de quem ordena:
  Vamos, não tenho todo o tempo do mundo!
Diante deste convite tão gentil eu não pude negar e o acompanhei a contra gosto.


O lugar onde Aléc me levou era um destes laboratórios tipo IML, cheio destas gavetas onde depositam-se cadáveres, haviam alguns recipientes onde viam-se formas de órgãos delineadas entre a tênue luz. Um frio misterioso cobria todo o ambiente, as luzes estavam quase todas apagadas, apenas uma ou outra isolada criava o ar de mistério ao qual me referi. Eu estava parada, meu corpo estava tomado por uma imobilidade sem explicação, lembro de estar parada diante de uma dessas mesas que se usa para examinar corpos, nela havia algo coberto por um lençol branco.
Aléc ao meu contrário parecia estar completamente a vontade diante daquela cena de terror misturado a ficção científica, foi então que minha mente por um segundo despertou de um marasmo em que estivera envolvida no último mês, parei de pensar somente no ambiente e comecei a ligar algumas coisas: eu estava sozinha em uma sala de laboratório cercada de corpos e com um homem completamente estranho enquanto minha família estava sabe-se Deus onde nas mãos de uma organização que acreditava na existência de seres de outros planetas e numa provável invasão. Foi como se eu despertasse naquele momento de um profundo sono, virei bruscamente para onde estava Aléc, haviam passado somente alguns segundos de nossa entrada naquela sala, mas eu os sentia como se fossem horas:
  Eu não posso participar disso! Não posso aceitar esse tipo de coisa!
— Não tens o que aceitar Taemy, as pessoas que são escolhidas para integrarem a organização não têm o direito de escolha, apenas o dever de obediência.
— Cretino! Eu te provo que não sou um cãozinho mandado!
— Não te adianta nada perder a paciência comigo Taemy, eu apenas estou aqui para te dar as provas que precisas para crer em alienígenas.
— Me prove então que existem alienígenas!


— Olhe!!! Quando ele terminou de falar ergueu o lençol e o que vi foi algo surpreendente, deitado naquela mesa estava um ser estranho, tinha a cabeça extremamente grande, olhos saltados aproximadamente dois centímetros para fora da cavidade, suas mãos eram dotadas de seis dedos, a pele grossa tinha uma cor marron esverdeada, os pés eram inteiríssos,  não tinham dedos ou qualquer sinal dos mesmos, porém o rostos daquela criatura apesar da cor estranha e dos olhos fora da órbita não me transmitiram uma aparência má, algo em mim viu aquele rosto como o rosto de um ser doce e gentil, mas estava ali, morto, sacrificado.
— Então, acredita em mim ou preciso te mostrar mais alguma coisa?
— Por onde anda o bom senso neste lugar?
— O que?!!!
— Ele está morto, inerte... o que fez para merecer isso?
— Era um alienígena, isso basta para que seja morto...
— Isso é cruel demais! Meu Deus, ao menos sabiam o que ele fazia aqui?
— Escute uma coisa Taemy, nunca questione a nossa organização, estou te avisando para que não sofras nenhum acidente durante a tua permanência neste lugar.
— Não me faça ameaças Aléc! Não sabes quem eu sou...
— Taemy! Não ouse me desafiar! E tem mais, olhe para mim quando eu estiver falando contigo! Pela primeira vez eu senti que ele comandava, senti quando num grosseiro toque ele me fez erguer o rosto e olhar em seus olhos.
— Não ouse tu Aléc, não ouse me obrigar a nada, eu não sou essa garota idiota que vocês pensam que capturaram para usar numa missão maluca de caça aos ETs!
— Muito bem!!! Vejo que finalmente a garotinha está se revelando! Isso é muito bom para ti Aléc, assim tu perdes essa tua mania de mandar em todo mundo aqui dentro. A voz era de uma mulher um pouco mais velha do que eu, ela havia entrado na sala sem que percebessemos.
— Elluanna, vejo que estavas por aí ouvindo nossa conversa! Aléc me esqueceu, voltou-se para a mulher e abriu um sorriso.


— Não estava ouvindo uma conversa Aléc, estava vendo até que ponto tu ias querer mandar nesta garota, mas é bom, é maravilhoso que tenhas encontrado alguém que não tenha medo de ti.
— Desculpem se eu interrompo a reunião de amiguinhos, mas quem é você? A essa altura eu já havia percebido que os dois não eram tão estranhos assim.
— Sou Elluanna, uma das mal fadadas agentes desta droga de organização ACO, Alien Capture Organism.
— Não sei até onde posso estar feliz de ter encontrado mais alguém aqui neste laboratório... Resmunguei.
— Calma Taemy, somos poucos e não podemos ficar nos engalfinhando por coisa pouca, na verdade somos apenas duas mulheres e isso nos deixa em uma situação bastante complicada. Não sei o que Aléc te falou sobre a ACO, mas creio que não tenha falado a verdade.
— E qual é a verdade Elluanna? Minha curiosidade estava sendo aguçada por aquela estranha.
— Vamos embora daqui Taemy, querias ver um dos nossos ETs, já vistes, agora tenho que te levar de volta para a base, meu pai não ia querer que te deixasse por aí. Aléc tentava desviar-me da estranha.
— Calminha Aléc, eu sei que tens medo que eu fale algo para como é mesmo o nome dela? Ah, Taemy... para Taemy, algo que possa fazer com que ela se revolte contra essas missões, mas não te preocupa, ela já não está apaixonada pala organização.
— Escute uma coisa Elluanna, se queres falar sobre algo com Taemy fale sobre o que te fez ver a ACO como algo mal, talvez isso evite que ela cometa o mesmo erro.


— Os dois querem parar de decidir por mim! Não me interessa o que a fez deixar de gostar de matar ETs! Me interessa como eu posso sair dessa ACO, como eu posso deixar de ser uma dessas idiotas que chamam de agentes! Eu estava cada vez mais atiçada.
O final de tudo foi Aléc me arrastando para fora do laboratório diante dos protestos de Elluanna, eu querendo ouvir, ela querendo falar e ele não querendo nenhuma das duas coisas, acabou por me levar quase que a força para a base e lá me deixou sozinha. Isso foi um dos erros que ele cometeu, eu havia decorado o caminho até o laboratório de estudos e mal anoiteceu eu voltei até lá, não sei de onde, mas consegui imaginar a senha perfeita para que eu entrasse e sem muito trabalho estava lá naquela mesma sala abrindo cada gaveta do tal IML marciano.
Todos aqueles seres tinham características próprias, pareciam não ser de um mesmo lugar, mas um deles me chamou atenção, não tinha nenhuma característica marciana, ao contrário, parecia um ser humano normal, não fosse uma grande mancha vermelho metálica na altura do abdômen.
Era o corpo de um homem, um homem ou uma sei lá o que, não sei qual tratamento eu daria naquele dia para aquela criatura, mas era uma humanóide sem a mínima dúvida, fechei a gaveta rapidamente, quando olhei para a mesa vi que não era o mesmo ser que eu havia visto naquela tarde que estava lá, era algo diferente, aproximei-me e retirei o lençol. Meu susto foi maior do que eu poderia esperar, não era um ET o que eu vi, não era um ser de outro planeta e sim Elluanna, estava esticada sobre a mesa e tinha a mesma mancha metálica no abdômen.
Pavor, foi o que senti naquele instante, um pavor que não saberia explicar, mas que naquele minuto foi cortado por uma voz forte vinda da porta da sala:


— Taemy, o que faz aqui no laboratório? Com que permissão saiu da base e veio até aqui?
— Aléc, o que fez com ela?
— Eles fizeram, ela morreu vítima do que procurou...
— Não estás falando a verdade, Elluanna estava muito bem hoje a tarde.
— Estava aqui justamente por estar contaminada com um vírus alienígena.
— E o que é essa mancha vermelha na barriga dela?
— Taemy, eu vou te contar o que houve com Elluanna, agora cubra esse cadáver e venha comigo até o escritório.
Eu não tinha lá muita escolha, cobri o cadáver e o segui.
— Escuta uma coisa garota, eu não sou mal e nem a ACO é má, eles são maus...
— Eles quem?
— A ACO está aqui para exterminar esses invasores, entenda isso, Elluanna não aceitou, acabou por envolver-se com eles, tornou-se amiga de uma das raças e o que conseguiu foi ser contaminada com aquele vírus, teve todo o sistema digestivo corroído e substituído por ma massa vermelho metálico, uma massa de fungos estranhos.
— E quem era o outro?
— Que outro?
— O que estava na gaveta?
— Samuel, um outro agente, era amante dela e foi contaminado por ela...
— Ah, quer dizer que ela foi contaminada, passou o vírus e ele é que morreu primeiro? Queres que eu creia nisso?


— Creia no que tu quiser Taemy, mas saiba que eu tenho o endereço de toda a tua família e posso visitar cada um quando eu quiser... ia ser bom, eu poderia conhecer eles e saber a quem tu puxou assim... tão teimosa.
— Não te arrisca a fazer nada com a minha família Aléc, ou eu não vou responder por mim!
  A tua família Taemy não é tua, ela pertence a ACO, e somente uma coisa vai poder deixá-los seguros: tu me obedecer piamente.
— Tu não podes fazer isso comigo Aléc, nem ao menos é tu o chefe desta organização...
— Sou o teu chefe e isso é o que me importa, meu pai é um dos chefes da ACO, mas existe outro, superior à ele... é uma escala Taemy, uma escala... tu deves saber que eu sou mais velho aqui e por tal motivo eu comando e tu obedece.
— Não te obedeço porcaria nenhuma! Não quero nem saber se a ACO é ou não uma organização forte, eu sou livre... completamente livre e não tem nada que me faço mudar de idéia. Aléc, eu não sou tua subordinada e nunca vou ser.  
— Taemy, estou começando a perder a minha paciência contigo, ainda estás sendo treinada e eu vou te dar o que mereces. Naquele momento ele tocou uma campanhia e logo vieram dois homens trazendo correntes, foi algo indescritível, me levaram para perto de uma parede onde havia uma espécie de maca larga e preta com quatro ferros, fui cadeada naquela maca, quando acabaram de me prender, me deixando completamente imóvel os dois homens saíram da sala.
— E então Taemy? Gostou da surpresa?
— Me deixa sair daqui Aléc, seu louco!


Aléc havia se aproximado de mim e tinha no rosto um sorriso indescritível, sua pele morena realçava os olhos num misto de azul e verde, parecia que eles lampejavam.
— Vai me deixar presa aqui neste lugar?
— Não, apenas vou te dar o toque final para que te tornes uma das nossas agentes, algo para que cada vez que te olhares te lembres quem és e o que tens de fazer. Não te preocupa, eu também recebi isso e me orgulho muito de ter essa marca registrada em mim.
Eu não fazia idéia do que ele queria dizer, mas algo me dizia que não era uma coisa boa, ele saiu da sala e voltou alguns segundos depois com um ferro e uma espécie de fogareiro.
— Minha nova agente, eu vou te contar algo... geralmente um especialista faz esse trabalho, mas hoje eu resolvi que eu mesmo terei a honra de te registrar, olhe, não é um belo efeito. Ao terminar de falar ele abriu a camisa e deixou exposta uma tatuagem, era um disco voador com as letras ACO, destas feitas a ferro e fogo.
— O que significa isso? Perguntei assustada e calculando o que ele pretendia.
— Isso é tua marca, nunca te olharás no espelho sem que te lembres da ACO.
Eu estava apavorada, vi ele acender o fogareiro e colocar aquele ferro sobre ele.
— Aléc, não faça isso!
  Não estás em condição de me pedir nada, eu vou fazer isso, onde preferes a marca? No braço? Não, seria muito óbvil e todos veriam... nas costas seria muito complicado, teria que te desacorrentar...
— Não quero isso!!!


— Bem, creio que isso ficaria muito bem na tua perna... Ao falar ele se aproximou de mim e começou a erguer minha saia até a altura da coxa esquerda.
— Tu não podes fazer isso! Eu tentei argumentar mas recebi como resposta um sorriso de escárnio.
— Olha só, é uma honra para mim te marcar, como se tu fosse gado, meu gado... e eu te mando como se isso fosse verdade.
— Não!!!
Minha negação não foi o suficiente, senti o calor daquele ferro queimando a minha pele, uma dor indescritível, por segundos ele apertou aquela marca em mim, senti vontade de chorar, mas não chorei, não ia dar meu braço a torcer.
— Pronto, veja só que obra de arte! Ele parecia frio, e então eu vi que aquilo era uma tortura por minha teimosia.
— Me solta!
— Está bem, agora podes te livrar das correntes, agora já estás marcada...
Queria que soubessem a dor que senti e o medo, afinal ele era capaz de tudo, mas quando me livrou das correntes eu saltei daquela maca:
— Nunca mais tu vai encostar um dedo em mim!
— Não, eu não encostarei um dedo em ti, mas sim toda a minha mão...
  Me deixa sair daqui!
— Hoje vamos dormir fora da base, eu não quero que tu fiques atormentando meu pai com esse queimado, terás febre durante a noite e eu vou ficar por perto.
— Não quero teus cuidados!


Mas eu já devia saber que não tinha querer, duas semanas depois eu estava com a ferida cicatrizada, tinha agora um disco voador marcado em minha perna. Só então voltei para a base, Aléc me levou, era assim, me deixava trancada dentro de um quarto durante todo o dia e só me deixava sair de lá a noite, mas junto com ele, me levava então ao laboratório de estudos para que pudesse ver a dissecação dos corpos.
Depois da marca eu não havia mais nem sequer trocado uma palavra com ele, soube que tive febre na primeira noite e delirei, mas não sei o que falei.
Quando encontrei Alexander novamente eu fui conduzida ao mesmo escritório das outras vezes, lá Aléc sentou-se ao meu lado.:
— Acredito que ela já está pronta para seguirmos a missão...
— Espero que sim Aléc. Me diga uma coisa Taemy, te sentes mais calma agora?
— Quero notícias de minha família!
— Estão bem, melhor do que tu, o que houve? Estás abatida! Alexander questionou o óbvil.
— Teu filho resolveu me dar a marca da ACO, nada mais...
— Aléc, isso deve ser feito por profissionais! O que tu fez?
— O trabalho ficou perfeito pai, veja! Ele expôs a cicatriz sem que nem ao menos me desse a chance de revidar, puxou minha roupa deixando a mostra aquela horrenda cicatriz.
— Isso é necessário Taemy... precisamos marcar nossos agentes, me desculpe por meu filho ter sido tão precipitado e ter feito ele mesmo a marca, costumamos deixar esse trabalho para um profissional, anestesiando o local e desinfeccionando. 
— Estou cansada de seu filho Alexander, cansada!!!
— Taemy, por favor, me deixe sozinho com Aléc, espere lá fora... Alexander talvez tenha percebido o meu descontentamento.


Quando saí a conversa continuou:
— Aléc, que loucura foi essa de marcar a garota sem o mínimo cuidado?
— Ela é muito teimosa, presunçosa e isso me irrita.
— Não podes fazer isso com a garota, ela é uma agente e não um brinquedo teu.
— Taemy é minha responsabilidade na ACO, o senhor mesmo me disse isso e eu a trato da forma que me agradar, se eu quiser matá-la eu a mato, se eu quiser ferir e firo...
— E o que mais? O que mais tu vai fazer com ela?
— Na missão eu saberei, não quero que ela vá pelo mesmo caminho da Elluanna, isso seria muito complicado para nós.
Eu não sabia, mas Aléc escreveria meu destino na organização.
O que sei é que dois dias depois fui enviada com Aléc e outro homem para um canto, um hotel num porto imundo, destes em que não há mais do que a higiene necessária e menos do que a cabível.
Neste porto deveríamos vigiar alguns homens que estariam roubando cargas de um certo minério para vender provavélmente para alienígenas oriundos de uma galáxia vizinha a nossa.
Uma manhã eu estava no meu quarto, dormia quase que profundamente, pois na noite anterior havíamos montado guarda até três da manhã para tentar encontrar os tais ETs. Acordei com alguém me beijando, o salto que di daquela cama não foi maior porque eu não sou pássaro para poder voar, porque senão haveria sido, fui parar do outro lado do quarto e só então encarei o meu estranho despertador:
— Hudson, o que significa isso?


— Foi só uma brincadeira, vamos logo, o Aléc está nos esperando na portaria, parece que finalmente os ETs vão chegar ao porto.
Hudson era o segundo agente que nos acompanhou ao porto, era um tipo alegre, sempre estava rindo de algo, muitas vezes vi Aléc chamar sua atenção, mas tinha seus atributos para estar na ACO, eram um arrombador de cofres profissional. Suas brincadeiras as vezes ultrapassavam um poucos os limites, mas nada que não pudesse ser consertado.
Aléc estava impaciente na recepção, vestido de preto mais parecia um daqueles agentes da MIB que a gente cansou de ver nos filmes, ao ver-nos começou sua secção de alertas:
— Isso não é correto, estão atrasados, como sempre... Que irresponsabilidade! Sabem o que temos para fazer hoje? Então vamos logo!!!
— Não liga muito para ele, isso é só porque não foi te acordar... Hudson cochichou no meu ouvido, aquilo soou tão irônico que não pude evitar o riso.
— E ainda riem de mim? Vou dizer uma coisa, nunca mais vou ter os dois juntos numa missão, nunca!!!
— Aléc, não fique assim tão bravo, o Hudson só me falou uma besteira qualquer, não foi sobre a tua pessoa....
Não havia como consertar o humor de Aléc e nem como diminuir o de Hudson, restou-me ficar entre os dois e rezar para que a missão terminasse ali.
Era pleno meio dia, sol escaldante e estavamos os três atrás de umas caixas, minha cabeça parecia querer derreter, eu não poderia suportar mais muito tempo, mas quando o relógio marcou exatas doze horas chegaram dois estranhos, de dentro de um navio saiu um terceiro, ouvimos claramente quando negociaram o tal minério, pude ouvir que os dois estranhos eram os ETs e o terceiro um terráqueo.


A história culminou com a prisão dos três, não sei o que houve, perguntei muitas vezes para Aléc o que havia sido feito deles, mas só o que descobri foi que os dois extra terrenos haviam sido dilacerados nos laboratórios e o terráqueo eu só sei que não foi enviado para uma prisão comum.
Comecei a perceber que as coisas não eram tão simples assim, eu não poderia saber de muitas coisas dentro da ACO, mas eu era curiosa, muito curiosa.
Eu havia ouvido Alexander falar sobre uma missão numa cidade do interior, mas nada mais havia sido mencionado e para piorar minha angústia Aléc simplesmente sumiu, me deixaram na base digitando uma pilha enorme de arquivos e pareciam ter me esquecido.
Eu não podia aguentar aquela prisão, não podia sair na rua, não podia falar com ninguém, somente Hudson as vezes aparecia na base e me alegrava um pouco com suas piadas.
Era uma tarde ensolarada, eu estava atolada em cinquenta páginas que precisava digitar em duas horas, Hudson chegou sorrateiro como sempre:
— Minha amiga, vim te buscar para darmos um passeio.
— Passeio? Como tu vai convencer o chefão a me deixar sair?
— Ele não precisa saber, saí pela porta dos fundos, te espero no jardim...
Hudson era louco e aquilo me agradava, éramos iguais.
Saímos de moto, rondamos por uma estrada deserta, ladeada por árvores frondosas, aquilo era bom demais, o ar parecia puro como eu nunca havia respirado.
Paramos na margem de um rio límpido e sentamos para ver a água correr, pela primeira vez eu me sentia livre depois de ter entrado na ACO.
— Sabe Taemy, eu não entendo porque tu veio para a ACO, nada aqui se parece contigo.


— Nem eu entendo Hudson, me raptaram, levaram a minha família para nem sei onde e agora só me resta ficar aqui.
— Não é o estilo deles, querem algo mais de ti...
— Me falaram de uma missão no interior, mas nunca mais repetiram isso.
— Taemy, cuidado com o Aléc, ele não tem escrúpulos, é capaz de tudo para ocupar o lugar que é do pai dele hoje!
— E tu? Como tu veio para a ACO?
— Eu fui escolhido, a alguns anos vi um disco voador e isso atraiu a ACO para a minha vida.
— Hudson, eu não sei o que vai acontecer comigo, mas eu não acredito nas boas intenções da ACO.
— Acho que é hora de voltarmos, não quero que o Aléc ou o pai dele deêm por falta de ti.
Quando cheguei na base encontrei Aléc na sala dos computadores.

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